quarta-feira, 24 de dezembro de 2014

[Fundo de Catálogo] Miles Davis - Kind of Blue (1959)


Há um conjunto de ideias usualmente utilizadas para descrever a importância de Kind of Blue: é o disco de jazz mais influente de sempre; é o disco que mesmo que não é grande apreciador de jazz já ouviu; o disco que introduz quase toda a gente ao jazz. Chavões à parte, todas estas premissas geralmente confirmam-se. Kind of Blue é mais influente disco de jazz da história e introduz muito boa gente à linguagem do improviso.



Ao contrário do mito que entretanto foi criado, à excepção de "Flamengo Sketches", Kind of Blue não foi gravado de uma assentada. Foi gravado em duas sessões no Columbia Records' 30th Street Studio, em Nova Iorque e contou com alguns dos maiores de sempre: Bill Evans, Jimmy Cobb, Paul Chmbers, John Coltrane e Julian Adderley. 

É um dos quatro registos editados em 1959 que assumem uma importância fulcral para o jazz. Time Out de Dave Brubeck Quartet, Mingus Ah Um de Charles Mingus e The Shape of Jazz to Come de Ornette Coleman completam a lista. A importância de Kind of Blue vai para além da excelência da música e das 5 milhões de cópias vendidas que lhe conferem o estatuto de disco de jazz mais vendido de sempre. Foi o disco que introduziu o jazz modal, ou seja, os músicos improvisaram variações melódicas com base nas escalas em vez dos acordes, numa resposta ao bee bop que na altura tinha Charlie Parker como expoente máximo. Davis defendia que a ausência de acordes no improviso dava-lhe a liberdade de tocar para sempre.



1959, ano de ouro para o jazz. Anos depois, os Pink Floyd haveriam de deixar-se influenciar para a estrutura dos primeiros acordes de "Breathe". É apenas um exemplo da influência de Kind of Blue na pop.

segunda-feira, 15 de dezembro de 2014

Clipping - CLPPNG


Se CLPPNG fosse um filme seria preciso estômago para chegar até ao fim. Uma vez que CLPPNG não é um filme - embora tenha duas belas curtas em forma de vídeo promocional, as de "Body & Blood" e "Work Work" -, não será preciso o estômago, mas sim ouvidos e predisposição para compreender a obra perturbadora que Clipping criou para a estreia discográfica, depois da mixtape do ano passado, Midcity. A violência industrial poder parecer gratuita, mas o rapper preparou uma complexa storyline que privilegia a decadência e a promiscuidade. Um dos mais entusiasmantes discos de hip hop do ano.



sexta-feira, 12 de dezembro de 2014

Gold-Bears - Dalliance


Parte do bom que vem dos Gold-Bears vem da honestidade, do facto de não terem nada a esconder. A página oficial de Facebook deixa as influências escarrapachadas Smiths, Neutral Milk Hotel, Elliot Smith, The Jesus & Mary Chain, Superchunk, The Wedding Present e por aí fora. Dá para ter um ADN mais indie do que isto? Ao ouvir Dalliance acrescentamos aquele modo de cantar com o coração na boca muito dos Thermals e a inocência shoegaze de uns The Pains of Being Pure at Heart. Tão honesto e bem concretizado que desculpamos a montanha de citações. Em boa verdade, não é isso que o rock faz há décadas?

quinta-feira, 11 de dezembro de 2014

Blu - Good To Be Home


Quando Blu nasceu, o hip hop ainda era uma criança. Estávamos em 83. O rapper nasceu e cresceu em Los Angeles, educado por um padrasto pastor e, como tal, influenciado pelo gospel e música cristã. O rap terá chegado através do pai. É essa Los Angeles, a Califórnia que o viu crescer - como pessoa, como rapper -, a casa que inspira este Good To Be Home. Antes, em 2013, trabalhou com Madlib, o que não admira pois é o nome que mais nos vem à mente quando atentamos exclusivamente na produção, responsabilidade de Bombay. A segunda metade do álbum que é duplo ameaça alguns desvios, mas acaba por não fugir ao sample soul a dar corpo às rimas de Blu. E é esse o problema, uma fórmula com poucos desvios que a certa altura cansa para se arrastar até ao final, marcado para o minuto 76.

sábado, 6 de dezembro de 2014

The Skygreen Leopards - Family Crimes / The Proper Ornaments - Wooden Hand


São de extrema melancolia alguns dos melhores discos que ouvimos este ano: de Atlas dos Real State a estes Family Crimes (na imagem) e Wooden Head, dos The Skygreen Leopards e The Proper Ornaments, respectivamente. Os primeiros criaram um disco de problemas de gente adulta, mas cujo som nostálgico nos leva à adolescência. E é nesse paradoxo que está o grande trunfo de mais um álbum de alguém que já anda nisto há cerca de 15 anos. Os Proper Ornaments juntam James Hoare dos Veronica Falls ao argentino Max Claps. Conheceram-se como no filme, em Notting Hill, mas a sinopse é um pouco diferente (e eventualmente mais interessante): a namorada cleptomaníaca de Max da altura pediu-lhe que distraísse o tipo da loja, James claro, que estava a ler um livro sobre os Velvet Undeground. Tínhamos banda - quem disse que o crime não compensa? Dois tipos que partilham afinidades musicais e que não têm receios de as confessar na música que é óptima e descomprometida: Beach Boys, Beatles, Velvet Underground. Nada a ver com os chatos dos Veronica Falls. 

segunda-feira, 1 de dezembro de 2014

[Fundo de Catálogo] John Fahey - Blind Joe Death (1959)


E no início era o rock' n' roll. O de Bill Haley, Elvis, Little Richard, Buddy Holly e Chuck Berry. A bossa nova dava os primeiros passos com João Gilberto e James Brown arrancava na sua jornada funk. A estreia de John Fahey era, portanto, um O.V.N.I. que na primeira edição contou apenas com 100 exemplares, tais eram as expectativas comerciais de Blind Joe Death. E foi com apenas 100 edições tornou-se num dos discos mais importantes de sempre. É como aquele mito (?) que diz que apenas uns milhares compraram a estreia dos Velvet Undeground, mas todos os que o compraram formaram uma banda - Fahey influenciou, entre muitos outros, senhores como Pete Thousand, Thurston Moore, Beck, mais recentemente William Tyler e - porque não? - Norberto Lobo.



O título terá sido em parte uma sugestão de um amigo: na altura, quase todos os artistas blues eram Blind qualquer coisa - Blind Willie Johnson, Blind Boy Fuller, Blind Joe Taggart, etc. Chegou a criar uma história à volta da personagem fictícia que dá título ao disco, levando-o por vezes a palco, através da sua personificação - conduzido a palco pelo braço e de óculos escuros. A outra parte da justificação do título estará no mais antigo fascínio da humanidade: a morte. Aliás, Fahey dizia sentir um instinto mórbido na altura. É fácil acreditar, o génio do fingerpicking era um alcoólico com aquela atitude muito punk (muito antes de o punk existir) de desresponsabilização e do it yourself - aprendeu tudo sozinho e criou a sua própria editora quase exclusivamente para se editar a si próprio. 


Blind Joe Death foi gravado na sua casa, em Takoma Park, Maryland. Ainda hoje vive (e como vive!) para lá dela e daqueles míticos (e hoje caríssimos) 100 exemplares. 


sábado, 29 de novembro de 2014

Black Bananas - Electric Brick Wall


Com as suas pares, Jennifer Herrema construiu nos 90s o legado que St. Vincent tem vindo a construir sozinha nos 2000. O paralelismo parra afirmar que Electric Brick Wall e Digital Witness são dois dos melhores discos de rock de 2014. Annie Clark criou um obra futurista, conceptual sobre o mundo digital, Herrema arranjou forma de fazer a música soar a ZZ Top (riffalhada), Sleigh Bells (beats hip hop) e Queens of The Stone Age (riffalhada stoner) a tocar ao mesmo tempo. É tão caótico como parece.


quinta-feira, 27 de novembro de 2014

O Balanço 2014 que é o Vodafone Mexefest #9 - Wild Beasts



Os Wild Beasts do início, qual grupo Vaudevillie, não se pareciam levar a sério. O caminho que se seguiu até chegar a esta obra-prima que é Present Tense primou pela coerência e por um som que já pede marca registada. A confusão começou com Two Dancers, registo de 2009 que com "Hooting & Howling" como cartão-de-visita confirmou um som mais cuidado e com o falsete de Hayden Thorpe como chavão. 

Present Tense só é mais do que Two Dancers e o mais tímido Smother porque as canções são melhores, porque tudo parece estar no sítio certo, como se de um sistema táctico ofensivo calibrado se tratasse. Há sempre um toque de génio que leva cada canção ao triunfo final. A sinceridade que a carga emocional da voz de Thorpe carrega é um trunfo, claro, mas não seria suficiente se tudo o resto não estivesse limado. Present Tense tem sido bastante comparado a OK Computer e percebe-se porquê: há uma obsessão pela produção que funciona a régua e esquadro, tal com o impecável penteado do vocalista dos Wild Beasts, eles, insaciáveis - tal como nós que só não estamos já a pensar no próximo porque não conseguimos parar de ouvir este.


terça-feira, 25 de novembro de 2014

O Balanço 2014 que é o Vodafone Mexefest #8 - Perfume Genius



A carga emocional da música de Perfume Genius é imensa. Too Bright segue as pisadas de Put Your Back N 2 It, mas segue caminhos ainda mais arriscados. Mike Hadreas parte das suas fraquezas - a figura franzina do músico, aliada a todas as inseguranças que vai documentando - para as transformar em forças: há muita confiança e risco na forma como Too Bright está construído - "My Body" e "I'ma a Mother", por exemplo, podiam ser dos Xiu Xiu. Nada disto parecia possível até aqui.

A homossexualidade faz parte de uma imagem cuidada e coerente: dos vídeos à capa, a luta contra a homofobia continua. Quem não quiser saber destes faits divers já tem muito com que se entreter: 11 portentosas canções.



segunda-feira, 24 de novembro de 2014

Strand of Oaks - HEAL


Podia ser a crónica da sua educação musical, o quarto álbum de Tim Showalter enquanto Strand of Oaks. Em "Goshen '97", por exemplo, descreve os tempos em que encontrou um rádio de cassetes do pai que o levou a apaixonar-se pela música e a ouvir Smashing Pumpkins. Na mesma canção convoca J. "Dinosaur Jr" Mascis para a guitarra e em "HEAL" cita Sharon Van Etten. Já o título de "JM", canção central, representa as iniciais para o recentemente falecido Jason Molina. 

Showalter quis um álbum maior do que tudo o que já fez, o que não era difícil pois o catálogo guardava canções de folk acústica sem grandes desvios. É também um disco de ajuste de contas com o passado, de redenção para com uma relação falhada. É atentar ao título do álbum, está lá tudo: HEAL, assim mesmo com caps lock activado que isto é para ser escutado como um dos melhores discos ROCK do ano.


sexta-feira, 21 de novembro de 2014

O Balanço 2014 que é o Vodafone Mexefest #7 - Tune-Yards


Se pudermos extrapolar algo da música de Tune-Yards para a sua personalidade, arriscamos dizer que a autora deste Nikki Nack é duas/três destas muitas coisas: excêntrica, uma criança num corpo adulto, hiperativa, louca, exuberante, irrequieta, pujante. Para além disso é uma das mais excitantes personagens da pop actual que construiu para si e para os seus um mundo de conto de fadas, fantástico, muito próprio.

Depois do magnífico W H O K I L L, um novo álbum de Tune-Yards era encarado com uma das mais aguardadas edições do ano. Expectativas máximas, portanto, que ficam longe de defraudadas. Continua a ser de uma miúda de bubblegum na boca uma das mais desafiantes propostas do ano, entre o caldeirão de género sem vontade de se definir. Das duas uma: ou Nikki Nack era completamente diferente de W H O K I L L ou Tune-Yards fabricava uma bomba tão explosiva como a primeira. Se apostaram na segunda opção: touché. Ao vivo vai ser de loucos.


quinta-feira, 20 de novembro de 2014

O Balanço 2014 que é o Vodafone Mexefest #6 - St. Vincent


No fundo, está tudo naquele vídeo em que St. Vincent faz corar muitos craques da bola com uma execução perfeita do "rainbow move" - "escolhe qualquer coisa, aprofunda-a, torna-te no melhor". Depois do "rainbow move", St. Vincent atirou-se à arte da guitarra que, tal como o futebol, não conhece muitas executantes no feminino. Esse estudo de St. Vincent levou-a a terrenos nunca antes pisados, conferindo a Annie Clark um som único e uma personalidade singular. 

O terceiro e homónimo álbum de St. Vincent é várias coisas: é o mais pessoal, é o que melhor equilibra melodia com virtuosismo e é o mais equilibrado conjunto de canções que Clark já escreveu. Junta o melhor dos mundos dos três registos anteriores, os dois enquanto St. Vincent e aquele que gravou com Byrne - "Digital Witness" podia estar em Love This Giant. Ainda bem que não está, pois no meio de tanto sopro e aborrecimento cairia no esquecimento. Mas a prova que a artista já domina as linguagens pop vem com "I Prefer Your Love", em que se nota a influência dela mesma, a Rainha Madonna. Brilhante.

quarta-feira, 19 de novembro de 2014

O Balanço 2014 que é o Vodafone Mexefest #5 - Pharoahe Monch


A partir de quando é que um rapper passa a ser um veterano do hip hop? Pharoahe Monch já cá anda desde o século passado, 1991, ano da estreia discográfica homónima dos Organized Konfusion. Ou seja, já cá anda há mais tempo que Jay-z e Eminem, só para citar dois mais notáveis. 

Pharoahe Monch marca o regresso do hip hop ao festival da Avenida - assim de repente, lembramos apenas da incendiária actuação de Spank Rock, em 2011, no Cabaret Maxime. Em destaque estará o mais recente PTDS - Post Traumatic Stress Desorder, álbum conceptual que acompanha um veterano de guerra (o próprio Monch numa batalha contra a indústria que o esqueceu?), cujo diagnóstico surge espelhado no título do álbum. O rapper chamou os seus colaboradores de sempre - a produção é quase toda de Lee Stone e Talib Kweli surge quase no fim, em "D.R.E.A.M." -, para denunciar os males da guerra e da desigualdade social. Monch vem de Queens pelo que as armas, a violência e as drogas não são esquecidos neste testemunho que, da capa à produção, incomoda.

terça-feira, 18 de novembro de 2014

[Fundo de Catálogo] João Gilberto - Chega de Saudade (1959)


Alguns anos depois de Pixinguinha, Dorival Caymmi, Carmen Miranda e Luiz Gonzaga contribuírem para o cancioneiro brasileiro, João Gilberto criava a bossa nova, essa espécie de samba suave. João Gilberto é um génio. Dizemo-lo sem receio nenhum de usar o termo que premeia as mentes mais incríveis, aqueles a quem devemos algumas das leis, linguagens, disciplinas, obras de arte mais importantes e estimulantes da humanidade. Mas Chega de Saudade, objecto fundador de um novo género musical, não viveu apenas do génio criativo de João Gilberto, o músico foi acompanhado por Vinícius de Moraes e Antônio Carlos Jobim, braços direito e esquerdo (ou vice-versa) na direcção que a obra-prima haveria de tomar.


Chega de Saudade é um objecto (quase?) perfeito. Gilberto é um daqueles perfeccionistas capazes de reclamar com o ar condicionado (aconteceu), responsável pela afinação defeituosa dos instrumentos. Não há notas ao lado, o músico de Salvador não o admitia - era capaz de repetir uma canção 28 vezes (sim, também aconteceu) até atingir a perfeição. A bossa nova era criada e era a banda sonora de uma juventude que ainda procurava uma voz. Representa o optimismo de uma nação que tinha acabado de ganhar a Copa do Mundo e tinha em Pelé o rosto do sucesso. Representava a procura pelo hedonismo - a praia, o namoro de liceu, a leveza. João Gilberto é essa voz, a primeira de todas.

O Balanço 2014 que é o Vodafone Mexefest #4 - Sinkane


Diz-me com quem andas dir-te-ei a que soas. Sinkane, ou seja, Ahmed Gallab foi músico de estúdio dos Yeasayer, Caribou e Of Montreal, alguns dos mais desafiantes projectos surgidos nos últimos quinze anos. Colaborou ainda com Damon Albarn, Blood Orange e Alexis Taylor dos Hot Chip, malta interessada em quebrar as poucas barreiras ainda existentes num mundo cada vez mais global. O Sudanês mais ocidental do momento começou com instrumentais e, há dois anos, enveredou pelo caminho da canção. Em boa hora o fez pois chega agora ao ponto mais alto de uma ainda curta carreira como produtor. Nasceu em Londres, cresceu no Sudão e viveu em Columbus, no Ohio. A paleta sonora não só acompanha a viagem, como ainda a amplia: jazz, afrobeat, funk, bossa nova alimentam este extraordinário Mean Love.

segunda-feira, 17 de novembro de 2014

O Balanço 2014 que é o Vodafone Mexefest #3 - Kindness


Há quem tenha colocado Kindness na prateleira chillwave, mania irritante, essa, de colocar tudo na prateleira da chillwave. Há ainda quem tenha dito que a sua música é house para hispters (seja lá o que isso for). A verdade: os rótulos mencionados são uma idiotice. A música de Kindness vai para lá da chillwave ou do house. É house, mas também é funk, disco, r&b e soul. No primeiro disco agarrou-se a Prince e no segundo surge aborrecido na capa, em contraste com um disco mais homogéneo para o qual chamou a nata da pop de hoje: Robyn, Kelela e Blood Orange. 

Woods - With Light and With Love


É sintomático que, desde 2006, os Woods não tenham picado o ponto discográfico apenas em 2013. Ponto de viragem? Nem mais. With Light and With Love é o primeiro disco dos Nova Iorquinos gravado num estúdio. Os fãs (fãs?) dos sete discos anteriores censurarão a opção pela maior fidelidade do som, mas é óbvia a abertura da banda a um mercado (mercado?) mais alargado. E, contas feitas, o som continua a explorar os mesmos territórios sonoros de sempre: do country à folk psicadélica. Por vezes lembram os Shins em boa forma, o que só pode ser um elogio, claro.

quinta-feira, 13 de novembro de 2014

O Balanço 2014 que é o Vodafone Mexefest #2 - Deers


"Só vão pescar a Espanha porque é mais barato", dirão as más línguas acerca da contratação das Deers para o evento. A preguiça poderia levar-nos a uma conclusão deste género, mas, ouvindo as quatro canções do quarteto feminino, só sobra água na boca e coloca a Garagem da EPAL na rota do primeiro dia do festival. Talvez aliciadas pela história da música popular - este som contorce-se em vénias ao Phil Spector dos anos 60 e das girls-groups -, as Deers gravaram as canções (apenas duas) de BARN, em Berlim. O pormenor delicioso está no facto de o terem feito com um telemóvel, ou seja, podiam ter gravado "Castiagadas En El Granero" e "Between Cans" na Madrid Natal. "Não vão meter água", afirmarmos em defesa das críticas mais preguiçosas.

Big Freedie - Just Be Free


Isto de ser Rainha do bounce não vem do nada. Big Freedia (homem, homossexual, faz questão de o sublinhar) já cá anda desde os 90s a assumir a posição de embaixador-mor dessa corrente que deriva do hip hop e que está tão na ordem do dia. Não é raro um rapper repetir a palavra que dá nome ao estilo inúmeras vezes, em canções que glorificam esse movimento de anca que privilegia traseiros grandes e redondos - Major Lazer hiperbolizou a coisa, mas fica a ideia. Just Be Free também privilegia a repetição de sons, um loop interminável de palavras, sons, coisa nenhuma. Não admira que isto ganhe nova vida ao vivo, o seu habitat natural. O quarto álbum de Big Freedla é composto por 32 excitantes e frenéticos minutos. Numa sala cheia deve ser incrível.

quarta-feira, 12 de novembro de 2014

Alex G - DSU


Alex Giannascoli, 21. Miúdo prodígio que se tem refugiado no quarto para criar algumas das coisas mais importantes da ainda curta, mas, adivinhamos nós, cheia de vida. Ritmo de "edição" "beatlesco" que pode ser comprovado no seu Bandcamp, canções com duração Guided By Voicianas, mas enxutas. As guitarras eléctricas e uma produção um pouco mais cuidada afastam-no de Julian Lynch, mas é essa a primeira referência que nos vem à cabeça.

terça-feira, 11 de novembro de 2014

O Balanço 2014 que é o Vodafone Mexefest #1 - Éme


Aguentem essas listas, muito do que de melhor se passa ou passou este ano vai passar por um dos palcos da Avenida da Liberdade. Até bem perto do festival, listaremos os nossos destaques.

Último Siso é o melhor disco da malta da Cafetra. Talvez porque não tenta colocar em prática o efeito repelente. Por mais que B Fachada defenda uma atitude singular - tanto em disco como fora dele - o que salta cá para fora é um estou-me-a-cagar-mas-afinal-não-estou. Não será um disco de viragem de todo o catálogo da editora, mas, ao segundo álbum, Éme, um tipo que parece estar a ser bem aconselhado (Walter Benjamin na gravação, Fachada na produção) demarca-se de todos os outros e assina um dos mais honestos e belos discos de 2014. Adeus som lo-fi, adeus acne, adeus último siso. Entusiasmamos-nos com o futuro.

segunda-feira, 10 de novembro de 2014

The Fresh & Onlys - House of Spirits


O caminho dos Fresh & Onlys tem ido no sentido de limpar o som, sujo no início, mais polido neste House of Spirits. Nada que impeça a distorção shoegaze de "Bells of Paonia"  ou as ligações menos óbvias ao psicadelismo - bem diferente de outras bandas (Foxygen, Thee Oh Sees) descaradamente psicadélicas de uma cidade que virou o fetiche do momento. Tim Cohen, o mentor disto tudo, compôs num deserto, no Arizona, bem perto da costa Oeste dos Estados Unidos, fonte de inspiração para essa western "Animal of One" que também lembra os Cure, a par de "April Fools". Continua embrenhado em referências, mas longe do garage rock de antes, o som dos Fresh & Onlys. Nem Fresh, nem Onlys, mas continuam a valer a pena.

sexta-feira, 7 de novembro de 2014

Dub Thompson - 9 Songs


Em 2004 eram os dois elementos dos Dub Thompson duas crianças com nove (sim, nove) velas sopradas, estreava nas salas de cinema um filme (?) intitulado de 9 Songs - basicamente, 71 minutos em que as imagens alternavam entre concertos de rock e cenas de sexo. Ou seja, bolinha no canto, os petizes ainda nem idade tinham para ver o Dragon Ball. A verdade é que 9 Songs parece ser uma referência ao filme-polémica que entretanto terá caído no esquecimento. Isto porque este 9 Songs "apenas" tem oito canções e um disco psicadélico e toda a gente sabe que nestas lides vale quase tudo.

E quão infindável será o caldeirão psicadélico em que até cabe uma faixa meio dub, meio rock, essa "No Time" que teve direito ao vídeo que podem ver aqui em baixo? Os Dub Thompson têm sido comparados aos Foxygen por duas razões: pelas origens (São Francisco) e pela produção deste 9 Songs, ao cuidado de Jonathan Rado, ele guitarrista dos... Foxygen. Clichés psicadélicos - exemplo: títulos de canções com nomes de espécies de dinossauros - à parte, o álbum de estreia dos Dub Thompson é um prometedor arranque de dois miúdos que ainda nem estão nos 20s.

quinta-feira, 6 de novembro de 2014

OOIOO - Gamel


Ao contrário da música de recursos limitados dos Konono No. 1, o som dos OOIOO parece ter possibilidades quase infinitas. Todas as canções têm metalofones, é esse o elemento comum a esta hora de som desregrado, com o som de uma guitarra aqui, um baixo ali, um registo tribal acolá, manobras psicadélicas mais adiante. O álbum está separado por faixas, mas podia não estar. Gamel é uma enorme faixa, partida em vários momentos que marcam mudanças semi-bruscas de abordagem. Quase não se notam, tivemos que espreitar várias vezes o player para verificar se já tínhamos mudado de canção. Desafiante viagem esta, a de um daqueles poucos álbuns que responde ao rótulo "world music".

quarta-feira, 5 de novembro de 2014

[Fundo de Catálogo] Nina Simone - Little Girl Blue (1958)


Naquela altura não havia ninguém como Nina Simone. Melhor: nem naquela altura, que eram os finais dos anos 50, nem nos anos que se seguiram (até hoje) recebemos alguém como Nina Simone, eximia ao piano, maleável na voz, insuportável no feitio. "Não eram os seguranças que a defendiam, era ela que defendia os seguranças", brincava-se na altura. Nina cedo começou a revelar esses traços de uma personalidade complicada, a mesma que surge espelhada na interpretação destas e de muitas outras canções. No primeiro concerto "a sério" - antes tinha sido cantora e pianista residente num clube, o Exclusive Side Street Club - pai e mãe, que se tinham sentado na primeira fila, foram obrigados pela organização a sentar-se no fundo da sala. Nina insurgiu-se contra a medida racista rejeitando começar o concerto enquanto os pais não regressassem à fila dianteira. E esta atitude leva-nos a uma outra temática: a da luta pelos direitos civis. Nina Simone seria das poucas personalidades a sobreviver. Já antes tinha sido rejeitada no conservatório. Motivo: cor da pele. 

A infância não foi fácil para Eunice Kathleen Waymon, o verdadeiro nome da artista. Nasceu no seio de uma família evangélica pobre e que não aceito as derivações estilísticas da miúda que ainda para mais tinha mau feitio. Eunice aldrabou a mãe e substituiu o nome de baptismo para fazer nascer a lenda Nina Simone. Assim podia actuar à vontade sem que a mãe a apanhasse a interpretar a "música do demónio".


Mas regressemos à primeira ideia: naquela altura não havia ninguém como Nina Simone. Nos anos 50, Sarah Vaughan, Billie Holiday e outras, bastantes outras, editavam novo álbum quase ao ritmo de mês-sim-mês-não, mas limitavam-se a interpretar vocalmente as canções em padrões jazz. Nina era diferente: não só usava o vozeirão de forma dramática, como ainda tocava piano com poucos. É o que faz nesta auspiciosa estreia, maravilhosa interpretação de canções populares e jazz.

quarta-feira, 22 de outubro de 2014

[Fundo de Catálogo] Johnny Cash - Johnny Cash and His Hot Blue Guitar (1957)


Quando editou Johnny Cash and His Hot Blue Guitar em 1957, Cash já tinha passado pela Alemanha, conhecido a rejeição do pai e carregava o sentimento de culpa na morte do irmão mais velho. Já tinha sido rejeitado pelo mesmo Sam Philips que o lançaria através da sua Sun Records - Cash queria o gospel, Philips considerava-o igual a tantos outros nesse campeonato. Foi repescado através de um country que não é (só) country - também é gospel (embrulha, Sam!), blues, rock, soul, etc.  

Quando editou Johnny Cash and His Hot Blue Guitar, o homem de negro já tinha editado "Cry Cry Cry", primeiro single, primeiro sucesso, motivação para continuar uma obra maior que acabaria por tocar em prisões. Actuações que, em noite de réveillon, inspirariam ex-reclusos a seguir uma carreira na primeira divisão country.



No início, Cash, confesso fã do Rei, imitava/homenageava/satirizava Elvis Presley durante os concertos. Apesar da boa disposição, a voz, as letras, a imagem já eram negras, muito negras. O passado de Cash a aterrorizar/inspirar o seu presente. A inspiração era tal que "as letras vinham à medida que as ia escrevendo. Levei 20 minutos a terminar a canção." O desabafo refere-se a "Walk the Line", provavelmente o grande clássico da estreia daquele que viria a ser apelidado de Keith Richards do country. A canção, sabemos, é dedicada à sua ex-mulher, é a ressaca do primeiro casamento, o que antecedeu uma das mais belas história da música contemporânea: Johnny Cash & June Carter.


Ainda antes da primeira edição a sério,  o homem que desafiava sem medos o público, virando-lhe as costas, já se tinha juntado a Elvis, Carl Perkins, Jerry Lee Lewis naquele que se tornou o primeiro super grupo de sempre, os Million Dollar Quartet. "Rock Island Line" toca o rock' n' roll, mas são artistas gospel e blues que o inspiram: as Sister Rosetta e as Rosettes, Bill Monroe, Hank Williams e Jimmy Rogers.

Com Johnny Cash and His Hot Blue Guitar, o gospel seria definitivamente enterrado, Johnny Cash começava a sua caminhada para se tornar na grande lenda do country. 

terça-feira, 21 de outubro de 2014

Fatima - Yellow Memories


Três discos soul importam reter em 2014: o disco celebração de Sharon Jones, a enésima metamorfose de Kelis e esta estreia de Fatima que dá pelo nome de Yellow Memories, registo que esbate fronteiras entre a neo-soul e a música electrónica, aninhando a voz da protagonista nos lençóis impecavelmente criados por mestres da produção pouco reconhecidos, mas altamente recomendáveis. Singular disco que é o primeiro mas tem maturidade de quinto ou sexto.

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quarta-feira, 1 de outubro de 2014

Lee / Arμ-2 - TANHÂ


Samples de hip hop e soul sacados por um produtor, Lee, durante a noite, em shuffle, no iTunes que perfazem um zapping de TV/Rádio global entre a cultura ocidental e a oriental. Saudável confronto. Está tudo aqui.

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sexta-feira, 26 de setembro de 2014

Sleaford Mods - Divide and Exit

É inegavelmente britânico um dos mais singulares discos de 2014. Divide and Exit, aliás, é quase uma breve aula de história da canção britânica - do punk ao grime, com passagem pela britpop. Os Fall, os Blur de Parklife, os The Streets de A Grand Don't Come For Free. As canções, também elas de duração punk, são curtos comentários/piadas sociais. Tudo com o típico humor britânico nonsense. Jason Williamson e Andrew Fearn, dois tipos chatos, bem chatos, de Nottingham, de dedo em riste e um arroto pronto a fazer arrancar uma ou duas canções. O problema é só um: a repetição da fórmula absurda que reza um comentário social por cima da produção raquítico, mas suficiente para os propósitos de um disco (já o dissemos?) singular.

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Makthaverskan - II


2014. Já não há grande paciência para revivalismo punk. E é por isso que o segundo de Makthaverskan surpreende. É punk, sim, mas a forma despachada e descuidada com que Maja Milner lamenta os erros do passado e as relações mal resolvidas durante a necessariamente conturbada adolescência não soam apenas a revivalismo barato. E o shoegaze, com sintetizadores dos 80s evitam a repetição de uma fórmula que nem chega a existir.

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quinta-feira, 18 de setembro de 2014

[Fundo de Catálogo] Buddy Holly - The "Chirping" Crickets (1957)


Gostamos de nos referir à forma como a malta da Stones Throw promoveu Mayer Hawthorne - um nerd com a soul na voz - como uma pedrada no charco. Mas, há mais de 50 anos, um outro tipo de óculos e aspecto pouco cool transformou-se num dos mais influentes músicos dos anos 50 e da história da música popular, referência essencial para a mais aclamada banda de todos os tempos, os Beatles. Buddy Holly foi, aliás, o primeiro a fazer várias coisas: o primeiro tipo sem apelo físico a triunfar no círculo rock' n' roll, o primeiro tipo a criar uma banda de rock e o primeiro tipo de rock a morrer tragicamente, num acidente (aéreo).



O geek pouco à vontade na televisão começou a cantar canções em igrejas baptistas para, depois, se deixar agarrar pelo bluegrass e pelos blues de Lonnie Johnson. São influências que se notam naquele que seria o único álbum de Holly com os Crickets. A trágica morte, com apenas 22 anos, haveria de cubrir um legado que ainda hoje dura. Pai "legítimo" dos Beatles - em 1964, antes da actuação no Ed Sullivan, John Lennon como porta voz dos Beatles haveria de perguntar: "foi este o palco que Buddy Holly em tempos pisou, não foi?" - e inspiração para Dylan, Stones, Beach Boys e outros monstros sagrados. Partiu cedo demais.

domingo, 14 de setembro de 2014

Chad Vangaalen - Shrink Dust


À imagens de vários pais do século XXI, do pós-Internet, Chad Vangaalen é aquilo a que se pode chamar de "pai mais cool do mundo". Tem dois projectos com os filhos, uma banda de hardcore chamada Crocodile Teeth & The Snugglers e outra techno intitulada de Banana Bread. Talvez inspirado por essa paternidade - a imaginação das crianças é um poço sem fundo -, Vangaalen criou um mundo de monstros, demónios e carregado de referências psicadélicas (a Baby TV explica). Se tivesse sido editado há cerca de dez anos teria sido colocado na mesma prateleira de Devendra Banhart ou Joanna Newsom,  a da freak folk. Hoje entra "apenas" na dos melhores discos que ouvimos este ano.

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sábado, 6 de setembro de 2014

Kelis - Food


Desde que a relação entre Kelis e Nas terminou, a um nível meramente qualitativo, ambos seguiram caminhos bastante distintos. O rapper regressou em boa forma com Life is Good, título que força a ideia de que já teria ultrapassado o complicado divórcio e Kelis editou Fresh Tone, cujo título também tem uma conotação literal mas ambígua - novo começou, depois do divórcio? Desvio criativo? A mudança de som é tão radical que apostamos as fichas todas na segunda hipótese. Com este álbum, e como é seu apanágio, Kelis atirou-se ao inesperado e juntou-se, por exemplo, a David Guetta e Benny Benassi - artistas que, relembre-se, fecharam a edição 2014 do Sudoeste, no Dia D, "D" de DJs e de dança. 

E agora algo completamente diferente: um álbum soul. "A sério, a voz de "Milkshake" a atirar-se à soul clássica da Motown, da Stax ou da Deep City?" Poderia ter corrido muito mal. No papel, a voz de Kelis é demasiado frágil para este tipo de som. Na prática, com Dave Sitek a bordo, na produção, a coisa é bem diferente e a grande arte de Food está na forma como camufla tão bem as fragilidades de Kelis e as transforma em forças. Surpreendentemente (Kelis não o sabe fazer de outra forma), o sexto disco da interprete (mais do que tudo, Kelis já provou que é uma enorme interprete) é um triunfo.

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[Fundo de Catálogo] Chuck Berry - After School Session (1957)


Quando After School Session "rebentou", Chuck Berry já tinha editado dois dos seus mais celebres singles, "Maybellen" (1955) e "Roll Over Beethoven" (1956). O álbum de estreia do preto que passava por branco na rádio foi gravado ao longo de dois anos e representou o segundo longa duração da Chess Records - o primeiro tinha sido o da banda sonora do filme Rock, Rock, Rock!, de onde saiu a icónica capa desta estreia.

Apadrinhado por Muddy Waters, Berry destaca-se no vestuário impecavelmente engomado e penteado milimetricamente trabalhado, mas o grande segredo está na forma como se mexia em palco - ora a tocar guitarra, com os pés e os joelhos a formarem um triângulo quase equilátero, ora quando se curva e aponta a guitarra como se de uma arma de fogo se tratasse - uma influência clara para Angus Young, o eterno "anão" dos AC/DC.



Reza a lenda que a mais famosa canção de After School Session e de todo o legado de Chuck Berry, "Roll Over Beethoven", é uma provocação à irmã que passava o tempo todo agarrada ao piano a tocar composições clássicas. Isto resume muito bem o legado de Berry: as suas canções são na verdade histórias - é-lhe muitas vezes atribuído o título de primeiro songwriter -, histórias que a música popular haveria de abraçar anos depois.

Dylan, os Stones, os Beatles, os AC/DC, Bruce Springsteen, só para citar de cabeça, foram todos tocados pela enorme influência do tipo singular e impecavelmente vestido que furava a América rascista cantando como um branco.

segunda-feira, 18 de agosto de 2014

[Fundo de Catálogo] Little Richard - Here's Little Richard (1957)


Numa altura em que havia tudo por fazer, encontramos diferenças claras entre o rock' n' roll de Bill Haley e Elvis e o de Little Richard. O jovem que veio do gospel demarca-se desde logo ao adicionar o piano a uma equação que já incluía sopros. As performances loucas eram condimentadas com monólogos e malabarismos - um saxofonista sola em cima do piano, enquanto Little Richard estica o pé a 90º. Os pais e os professores não gostam, os brancos imitam e vendem a sua própria versão dos acontecimentos. 



As performances teatrais que o jovem de Macon já ensaiava na igreja são agora levadas ao extremo, a noção de espectáculo adensa-se e Little Richard não dá hipóteses à concorrência. Eléctrico como poucos e polémico como nenhum outro - é atentar em "Tutti Frutti", mais que debatida canção de cariz sexual (perdão: homossexual) que lançou o puto talentoso do coro da igreja para os topes da Billboard. 



As dificuldades em lidar com o pai - nunca aprovou o comportamento de Richard - levam-no a deixar casa dos progenitores ainda na adolescência, tentando a sua sorte no mundo do espectáculo. O resultado é o que conhecemos: Here's Little Richards é um dos discos mais importantes da história da indústria discográfica. Meses depois convertia-se criando a Evangelist Team, espalhando a palavra estrada fora. O regresso seria feito de forma fria e com um retorno às raízes: o gospel. 

segunda-feira, 11 de agosto de 2014

Future Islands - Singles


Não é frequente, mas vai acontecendo: de tempos a tempos, o artista lá aproveita o tempo de antena que lhe é dado num espaço televisivo para oferecer algo mais que a interpretação aborrecida de uma canção. Já passaram mais de seis décadas desde que Elvis saltou para o mainstream no Ed Sullivan Show e os desvios continuam a ser raros. Assim de repente, lembramos os dos Arcade Fire no Letterman e no Saturday Night Live e dos Odd Future no Jimmy Fallon. Recentemente, os Future Islands juntaram-se ao restrito clube numa interpretação intensa de "Seasons" - sim, o facto de ser uma senhora canção também ajuda - no Letterman. O desvio no caso dos Future Islands centra-se no vocalista Samuel T. Herring, voz versátil, que vai da soul ao black metal, e inegável carisma que vale comparações com Ian Curtis. Singles faz jus ao nome, mas não é por isso que soa a plano premeditado de ataque às tabelas de vendas. A banda vai estar dia 23 de Outubro no Musicbox, em Lisboa para tirar todas as dúvidas.

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quarta-feira, 30 de julho de 2014

[Fundo de Catálogo] Elvis Presley - Elvis Presley (1956)


Não era suposto o puto ser Rei, nem do liceu, nem do rock' n' roll. Mas foi. "Heartbreak Hotel" foi o primeiro sinal que o álbum homónimo viria confirmar. Gravado entre os Sun Studios, em Memphis, e os estúdios da RCA, em Nashville, Elvis Presley chega às lojas a Março de 1956, alcançando o nº 1 do Top Pop Albums da Billboard. Por lá se manteve durante dez semanas, feito incrível para uma linguagem que ainda dava os primeiros passos. Se o disco de estreia de Bill Haley trouxe o rock' n' roll para o mainstream, Elvis elevou-o à estratosfera comercial. O homem já era alvo de alguma atenção, mas a estreia discográfica torna-se no primeiro álbum de rock a bater a marca do milhão de unidades. É apenas neste contexto que conseguimos perceber a célebre citação de John Lennon: "Before Elvis, there was nothing" (Antes de Elvis não existia nada).



Elvis, o cantor, o artista, o performer, tinha tudo para não resultar. A inabilidade televisiva, os dedos que apontavam na direcção de um tipo branco a cantar música de negros. Mais importante ainda: grande parte dos jovens norte-americanos queriam ser como ele e (surpresa!) pais, padres e professores não gostavam da ideia. Elvis era visto como um rebelde e despertava a sexualidade nas mulheres. Mas, como desde o início dos tempos, o fruto proibido é o mais apetecido. Elvis só não se tornaria Rei do liceu, onde terá passado despercebido. 

A imortalidade e mitologia de Elvis Presley começa pela capa: durante anos pensou-se que a fotografia da mesma era autoria de Popsie Randolph, uma vez que no álbum surge creditado como fotógrafo. Já em 2002, o produtor Joseph A. Tunzi viria a esclarecer tudo, destacando o facto de a fotografia pertencer a William V. "Red" Robertson, ele dos Robertson & Fresh. Mas o legado vai para lá da sua beleza e mitologia. A capa de Elvis Presley inspirou, entre muitas outras, a icónica capa de London Calling, o álbum clássico dos Clash. 


Elvis era acima de tudo um performer, pelo que nenhuma destas canções foi escrita pela sua pena. "Blue Suede Shoes", por exemplo, é um original de Carl Perkins influenciado pela experiência de guerra de Johnny Cash. Reza a lenda que Cash terá conhecido um aviador chamado C. V. White durante a 2ª Grande Guerra, na Alemanha. Certo dia, em conversa, White ter-se-à referido aos sapatos dos próprios aviadores como "blue suede shoes". Cash terá contado esta história a Perkins juntamente com um pedido: "escreve uma canção sobre isto". Nunca tendo visto tais sapatos, Perkins guardou a ideia na memória. Mais tarde, num concerto do próprio, um tipo da plateia virou-se para Perkins reclamando para que não lhe pisasse os sapatos, os tais blue suede shoes. "I Got a Woman", "Tutti Frutti" (a do mítico "a-wop-bom-a-loo-mop-a-lomp-bom-bom") são outros célebres originais que Elvis repescou. A ascensão começou aqui.

quinta-feira, 17 de julho de 2014

[Fundo de Catálogo] Bill Haley & The Comets - Rock Around the Clock (1955)


Datar o início do rock' n' roll é uma das maiores discussões do século XX e XXI. Já descontando que há quem diga que o rock' n' roll não é mais do que o rythm & blues tocado por brancos, passeamos pelo YouTube e assistimos a acesos debates relativamente a algumas canções dos primórdios do rock n' roll. Há quem diga que é esta, outros dizem que é esta, uma maior quota-parte diz que é esta e a maior parte diz que não é nenhuma destas, mas sim outra, algures perdidas nos finais dos anos 40/inícios dos 50. 



O consenso surge no momento de apontar a primeira canção, aquela canção que tornou o rock' n' roll numa coisa de massas, a canção que alcançou as tabelas de vendas (nos Estados Unidos da América e no Reino Unido, na sequência dos créditos iniciais de Blackboard Jungle) e airplay nas rádios: "Rock Around the Clock", a primeira canção do álbum homónimo, o terceiro de Bill Haley. Mas o parto de uma das mais célebres canções de sempre não foi fácil: o clássico foi editado pela primeira vez como lado B desse outro clássico que é "Thirteen Women (and Only One Man in Town)" e, diz toda a mitologia em redor do mesmo, foi copiado de uma gravação dos finais da década de 40 de Big Joe Turner, apenas porque se chamava "Around the Clock Blues". As canções não são de todo semelhantes e argumenta-se ainda que a melodia da canção de dois minutos e oito segundos de Haley é similar à de "Move it on Over" (1947) de Hank Williams, que, por sua vez, é similar a "Going to Move to Alabama" (1929), de Charley Patton, que, por sua vez, deriva de "Kansas City Blues” (1927), de Jim Jackson. Sim, nos anos 50, o rock’ n’ roll já se auto-citava constantemente.



Mais mitologia: antes de "Rock Around the Clock", cujo título original terá sido "We're Gonna Rock Around the Clock Tonight", Haley tentou uma carreira como cantor country e experimentou relativo sucesso com "Crazy Man, Crazy", canção que atingiu o nº 1 do Top Billboard R&B. A 7 de agosto de 1955, Bill Haley & The Comets haveriam de apresentar-se no Ed Sullivan Show e, dois anos depois, viajaram para a Europa. O sucesso da canção acabou por ser capitalizado em filme e até deu uma paródia para a Rua Sésamo.

O resto do álbum não é tão memorável, mas é material clássico. "Shake, Rattle and Roll" é uma versão do original gravado por Big Joe Turner que chegou ao primeiro lugar no top rythm & blues norte-americano da Billboard. A história cruzou-os várias vezes e Turner e Haley haveriam de se tornar amigos e fazer uma digressão pela Austrália, em 1957. Elvis também ele, gravaria uma versão do clássico. No campo das curiosidades (mórbidas), Danny Cedrone, músico de estúdio que tocou guitarra na versão de Turner haveria de morrer apenas 10 dias depois da gravação, tornando-se esta a sua última e mítica sessão de estúdio. 



"Thirteen Women" conta a história de um homem que sobrevive a uma bomba nuclear e que se vê sozinho, apenas rodeado de mulheres. A guitarra que ouvimos terá sido criada com a intenção de simular explosões de hidrogénio. Mais tarde haveria de aparecer a resposta feminina - versão dos acontecimentos: explosão nuclear com uma única mulher sobrevivente, rodeada de vários homens. 

Especule-se o início do rock' n' roll, mas, tal como o conhecemos, começou aqui. Elvis haveria de explodir pouco depois e é impossível quantificar o número de bandas ou artistas que se sentiram inspirados pela obra do Neil Armstrong do R&B, Mr. Bill Haley e os seus Comets. 

sexta-feira, 4 de julho de 2014

[Volta ao Mundo] Albânia #6: A pop albanesa - Parte I


A pop albanesa pode dividir-se em dois grupos: o que explora as raízes locais e o ocidentalizado. O primeiro constitui a velha guarda, artistas que começaram nos anos 80, como Parashquevi Simaku e Merita Halili - a primeira conheceu reconhecimento ainda nessa década, a segunda, com influência turcas, só atingiu o estrelato a meio da de 90. Nos anos 90, há ainda Adelina Ismadli (cantora, actriz e modelo, enfim, uma estrela à escala regional) que explora a música tradicional albanesa, funde-a com a electrónica e torna-a dançável. 

quarta-feira, 11 de junho de 2014

Rome Fortune - Beautiful Pimp II


À imagem da primeira Beautiful Pimp I, no segundo capítulo desta série de mixtapes, o rapper coloca a filha e o traseiro de uma mulher de roupa interior na capa. A primeira era escura e só conseguíamos vislumbrar a cara do rapper, na segunda já há luz e, para além da face de Rome, vemos a da sua filha e a da tal mulher que continuamos sem saber quem é. Tem que ser um álbum pessoal, seja pelas rimas, seja pela presença da filha numa das faixas (à imagem do último de Schoolboy Q), seja pela presença do vibrafone que é aqui tocado pelo próprio avô do rapper. Beautiful Pimp II é melhor do que Beautiful Pimp I. Porque é mais arrojada. Porque melhora aquilo que precisava de melhorar (as rimas, o flow) e consegue ser ainda melhor naquilo que já era boa (a produção).

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segunda-feira, 9 de junho de 2014

Curren$y - The Drive In Theatre


Mais uma excelente mixtape de Curren$y, a primeira do prolífico rapper em 2014. Uma homenagem ao filme favorito do rapper, The Godfather com referências e citações que são samples da longa de Coppola. Mas, mais do que uma homenagem ao clássico do cinema, The Drive In Theatre é uma homenagem à 7ª arte - aos clássicos, aos filmes de gangsters, à blaxploitation, a Tarantino. Tudo mediado pela voz narcótica de Curren$y que vem bem acompanhado por rappers como Le$, B-Real, Freddie Gibbs e Action Bronson (desta feita, incrível em "Godfather 4"), entre outros. 

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