terça-feira, 28 de julho de 2015

[Fundo de Catálogo] Supremes - Where Did Our Love Go (1964)


Para chegarmos à história da Motown e da explosão das Supremes, há que recuar aos anos 20 e 30, quando milhão e meio de afro-americanos terão deixado o Sul rural para investir numa vida melhor nas cidades industrializadas de Cleveland, Chicago e, claro, Detroit. A Motown foi um produto da cidade, da Motorcity que antes de conhecer a bancarrota nos anos 70 e adiante, representou o progresso até aos 60, com a General Motors, a Chrysler e a Ford. Esta última e a sua linha de montagem terá sido a inspiração para a editora, também ela uma linha de montagem, sim, mas de produtores e músicos. Os produtores: Lamont Dozier e os irmãos Brian e Eddie Holland. Os músicos: The Miracles, Martha and the Vandellas, The Temptations e os Four Tops, só para citar alguns dos mais celebrados na altura. 



O dinheiro não é o mais importante, dizia-se. E conseguimos acreditar que o que movia aquele conjunto de artistas era o progresso, a vontade de criar e continuar a desbravar caminhos. A evolução, tal como nos carros que eram construídos ali ao lado, é vital. O processo: escrever a canção, escolher o artista, arranjar a canção, entrar em estúdio, gravar, mixar e produzir. E a rodela estava na rua. As Supremes fizeram deste processo um trunfo e representaram a primeira banda de mulheres negras a ser alvo de grande exposição, foram as primeiras a colocar três singles do mesmo álbum no Top da Billboard. Where Did Our Love Go aguentou-se quatro semanas na 2ª posição e 89 nos Tops da mesma Billboard. Por outras palavras: introduziram o "Motown Sound" às massas.



Mas as Supremes não acertaram à primeira. Não: vários singles falharam ao longo de quatro/cinco anos, até que, inspiradas pelo som Phil Spector chegaram lá, ao estatuto de quase-Beatles. Where Did Your Love Go tem muito daquilo que o som das girls groups haveria de nos habituar: palmas, coros doo-wop e grandes melodias. E tem a faixa-título e "Baby Love", clássicos para sempre. O domínio haveria de durar até 1969, altura em que o ego de Diana Ross a levou para o campeonato da pop.

terça-feira, 14 de julho de 2015

[Fundo de Catálogo] Bob Dylan - The Times They Are a-Changin' (1964)


The Times They Are Changyin' surge na sequência de várias mudanças na vida emocional de Dylan, nomeadamente o fim da relação com Suze Rotolo - recordemos que é ela que surge agarrada ao músico na capa de The Freewheelin' Bob Dylan. Tornara-se a voz da sua geração, um escritor de canções. Este 3º álbum leva-o ainda mais longe que os anteriores, colocando o dedo na ferida em várias frentes: os direitos civis, a guerra fria e a luta de classes. As influências vão das baladas irlandesas e escocesas e a poesia beat.


The Times They Are Changyin'. A expressão ainda hoje é usada de forma corriqueira. Surgia pela primeira vez, poucos meses depois da morte de Kennedy e do sonho de Martin Luther King. Ao contrário dos álbuns anteriores, é um disco sério, duro, negro, preocupado. Assombrado pela morte e pela guerra - o perdão da Alemanha, na sequência da II Guerra, por exemplo, tão na ordem do dia, é aqui mencionado, prova magna de intemporalidade que viria a ser testada 20 anos depois, quando Steve Jobs usou a expressão para revelar o primeiro Macintosh.

terça-feira, 26 de maio de 2015

[Fundo de Catálogo] Bob Dylan - The Freewheelin' Bob Dylan (1963)


The Freewheelin' Bob Dylan é o verdadeiro primeiro álbum do músico de Minnesota. É-o por motivos vários: é o primeiro em que se faz escritor de canções, é o primeiro dominado por originais - a proporção de covers-originais é inversamente proporcional à da estreia homónima - e é aquele que lhe dá o título de "voz da sua geração". Esteve para não acontecer - À imagem de muitas outras editoras, a Columbia queria desistir do músico, sendo sua vontade rescindir o contrato, na sequência do falhanço de Bob Dylan que vendeu 5 mil cópias. "A Loucura de Hammond", foi assim que passou a ser apelidado - Hammond é John Hammond, o produtor que acreditou no seu talento. Com The Freewheelin' Bob Dylan, a "Loucura de Hammond" passaria a ser bem menos louca. O produtor defendeu que o segundo disco seria um sucesso. Finalmente acertou. 



De Bob Dylan para The Freewheelin'..., o músico terá crescido imenso como escritor de canções. Clinton Heylin, homem que muito estudou Dylan, liga esta maturidade ao facto de, em 62, o jovem Dylan se ter mudado, com a namorada Suze Rotolo, para um apartamento em Nova Iorque. A ligação vai para lá do juntar dos trapos: os pais de Rotolo tinham grandes ligações políticas, estando ambos ligados ao Partido Comunista Americano. Não admira, pois, que o The Freewheelin'... seja extremamente político, focando-se nos direitos civis e na guerra fria e respectiva ameaça nuclear. Uma terceira temática assombra o registo: a própria Rotolo. Em Julho de 62, a ainda namorada de Dylan viaja, com a mãe, para estudar durante 6 meses em Itália. Dylan começa a escrever com a esperança que a companheira regresse depressa. Esta viria a adiar o regresso e manifestava a vontade de não ser apelidada de "a miúda do Bob", uma vez que as atenções caiam sobre ele, independentemente do fracasso do material de estreia - ironia: ainda hoje é conhecida por ser a ex-namorada de Dylan. 



Entretanto, no final de 62, Dylan terá passado por Inglaterra e depois viajado para Itália, para se encontrar com Alber Grossman, o manager, e a namorada que, entretanto, já tinha regressado a Nova Iorque. Regressa também ele a Nova Iorque, onde Grossman manifesta vontade de substituir Hammond, motivo pelo qual, a Columbia, evitando divergências, acaba por colocar Tom Wilson, um produtor jazz afro-americano ligado a nomes como Sun Ra e Coltrane e que, até conhecer Dylan, acreditava que a folk era para estúpidos, na produção. 

Em cima da edição, em Maio de 63,, é convidado para actuar no Ed Sullivan Show. Canção escolhida: "Talkin' George Birch Blues". Problema: a CBS considera-a difamadora e obriga-o a trocar por outra. Dylan recusa. Também em cima da edição, Dylan actua com Baez no Monterey Folk Festival e dão início a uma fugaz relação. The Freewheelin'... também é isto: o fim de uma relação - a Rotolo surge ainda na icónica capa do álbum - e o início de outra, embora ambas efémeras.



O sucesso do álbum é inegável - em um mês venderia o dobro de Bob Dylan. Bob Dylan, "a voz da sua geração". Começava aqui.  

quarta-feira, 20 de maio de 2015

[Fundo de Catálogo] Beatles - Please Please Me (1963)


Em 1963, os Beatles consideravam-se uma banda de palco pelo que a sua vontade era que Please Please Me tivesse sido gravado ao vivo. A ideia inicial era gravar no mítico Cavern Club, em Liverpool, em Dezembro do ano anterior, mas Please Please Me acabou por ganhar forma nos estúdios da EMI, em Abbey Road, numas míticas gravações que duraram menos de dez horas. Os planos eram ainda mais apertados: estavam agendadas apenas duas sessões: uma de manhã, outra à tarde. A nocturna viria a ser acrescentada depois para a gravação da versão de "Twist And Shout", já depois das 22h, deixada para o fim pelo produtor George Martin que, devido à constipação que atingia Lennon, a guardou para o final, temendo que o Beatle ficasse sem voz. Sobre estas dez horas, Mark Lewisohn escreveria anos depois que terão "sido os minutos mais produtivos da história da música gravada." 


Para além da inquestionável qualidade destas 13 canções, Please Please Me é um marco na história da indústria discográfica por uma infinidade de razões, mas a mais notável prende-se a um nível comercial: o disco ficou 30 semanas no top, algo pouco habitual na altura, em tabelas dominadas por bandas sonoras, cantores e Elvis. Se hoje em dia olhamos para os Beatles como uma influência de quase tudo o que é acorde, não é menor verdade que os quatro de Liverpool também se deixaram influenciar por uma data de gente importante da altura: Chuck Berry, Buddy Holly, os Isley Brothers, Smockey Robinson e as Shirelles - os coros doo hop e a versão de "Boys" -, por exemplo. 



Diz-nos a mitologia Please Please Me que o álbum era para se chamar Off the Beatle Track e que a ideia inicial (do produtor George Martin) para a capa seria colocar os Beatles dentro de uma jaula de insectos - referência óbvia ao besouro, tradução directa de Beatle. Martin era membro honorário da Zoological Society of London, detentora do Jardim Zoológico londrino. Recusada a ideia, ficou a fotografia final, tirada pelo fotógrafo Angus McBean nas escadas do quartel general da EMI, em Manchester Square, na capital inglesa. 

Please Please Me não é perfeito, nem tinha que o ser, mas prova que um álbum pode ser gravado em menos de 24 horas e ser um clássico.

terça-feira, 12 de maio de 2015

Vic Spencer - The Cost of Victory / BADBADNOTGOOD & Ghostface Killah - Sour Soul


Dois rappers, uma promessa e um veterano. O primeiro, Vic Spencer (álbum na imagem), revela algumas afinidades com Chance the Rapper - com quem, inclusive, já colaborou - e em "The Writers" chega a lembrar a colaboração entre os Slum Village (ainda com J-Dilla) e D' Angelo no magnífico clássico hip hop Fantastic, Vol. 2., curiosamente, estas duas referências (Chance e Slum Village) vão estar num imperdível festival português em julho - nunca imaginámos dizê-lo, mas, cabeças de cartaz à parte, o Sumol Summer Fest de 2015 é altamente recomendável. Assim como o disco de Spencer.


O veterano Ghostface Killah já não terá nada a provar, daí que seja 100 por cento legítimo que comece a inventar colaborações inesperadas como é esta com os BADBADNOTGOOD, trio de jazz instrumental que já pegou em canções de rappers tão diferentes como A Tribe Called Quest, Gucci Mane e Nas. A coisa até casa bem - o hip hop há muito que se vai fazendo valer de samples jazz, a diferença está no facto de aqui, a instrumentação ser orgânica -, mas, liricamente, a falta de ideias de Ghostface começa a ser recorrente. Não é de espantar que o melhor momento esteja reservado a um Danny Brown em estado de graça. 

sábado, 18 de abril de 2015

POND - Man It Feels Like Space Again


É muito provável que seja desta que os POND se destacam definitivamente do rótulo de projecto paralelo dos tipos dos Tame Impala, até porque a ligar as duas bandas, já só sobra o baterista Jay Watson - Nick Allbrook deixou os Tame Impala e Kevin Parker já só toca na produção deste Man It Feels Like Space Again. Há, pois, melodias para retirar os POND do relativo anonimato. O sexto álbum dos australianos - o ritmo é de um por ano - não faz muito por se afastar da linha dos anteriores, mas saca meia dúzia de excelentes melodias que, no meio de todo este delírio psicadélico, o tornam acessível.





segunda-feira, 13 de abril de 2015

[Fundo de Catálogo] Dick Dale - Surfer's Choise (1962)


Dick Dale era apenas um surfista teso, um fã do country de Hank Wlliams, sem um tostão ou dólar. Sozinho inventou a surf music, uma das variantes do rock' n' roll que explorou o formato canção e o instrumental. 

É na guitarra que está a pedra de toque do género, uma nova abordagem que foi contra todas as convenções: o instrumento colocado ao contrário e com um som que parecia o de uma bateria e com eco. Os Shadows também terão sido uma influência, foram a banda que mais perto chegou ao som da guitarra de Dale, ele filho de pai libanês, cuja influência se vai notando no material do músico.


Dale era surfista, mas para ser da cena não era necessário sê-lo - apenas um dos Beach Boys (que também se estrearam timidamente em 62) o era. Mas justificou o surf como moda da altura: a Califórnia como palco de uma loucura generalizada - os jovens queriam praticar surf. Como ainda hoje acontece com outras modas, muitas foram as bandas que começaram tão rápido como acabaram: os Belairs e os Gamblers, por exemplo.


Depois do rock' n' roll, os sons multiplicavam-se: a surf music inventou uma dança, uma cena, um som. Dale chegou a trabalhar com a Fender na tentativa de criar um som mais alto e denso, algo que terá estados por trás da criação do heavy metal.

sexta-feira, 10 de abril de 2015

Father John Misty - I Love You, Honeybear


Josh Tillman, ou seja, o pregador Father John Misty tem os mesmo problemas que quase todos nós, personagens de um mundo contemporâneo de bolsos rotos, mas com smartphone em punho. John Misty refere "Deus" e "Jesus" umas quantas vezes, mas estará longe de ser cristão. "Amarás o próximo como a ti mesmo", sim, mas com a tecnologia fica difícil dares-te com o outro, quanto mais com o próximo. "True Affaction", paradoxalmente, discorre sobre essa mais do que debatida questão da substituição das pessoas pelo iPhone. Durante a transição de Fear Fun para este I Love You, Honeybear, Tillman encontrou o amor, seja lá o que isso for para John Misty, o sarcástico alter-ego. Nota-se na faixa homónima, apesar da dificuldade em discernir o que é sarcasmo do que é sincero. Não o queremos comparar às muitas faces de Dylan nem a Bowie, mas Father John Misty brinca com as nossas percepções e apela à nossa atenção num mundo em que é cada vez mais difícil parar durante 44 minutos e ouvir um grande disco.

segunda-feira, 16 de março de 2015

[Fundo de Catálogo] Ray Charles - Modern Sounds in Country and Western Music (1962)


Não é o primeiro álbum de Ray Charles para a ABC-Paramount Records, mas é o primeiro em que se faz valer da cláusula que defende a sua total liberdade criativa. A editora chumbou um disco de versões country, mas Ray agarrou-se à tal clausula e, apesar das tentativas da editora, avançou para aquele que é, muito provavelmente, o álbum mais importante da sua carreira.



Um álbum country na voz de um preto, em plena luta pelos direitos civis? O antecipado suicídio comercial acabou por resultar num marco nas lutas dos negros nos anos 60. Cada som tem uma raça, diziam-lhe. E ele discordava. Hoje é fácil dar-lhe razão, mas em 1962 ainda não tinha passado meia década desde que Chuck Berry perdeu a sua base de fãs branca, no momento em que a mesma descobriu que aquele tipo com voz de branco era afinal um negro.



A pergunta mantém-se: um disco de versões country em 62? Calma, são versões country com roupagens jazz, gospel e r&b. Resultou tão bem que, três meses e 500 mil cópias vendidas depois, era a editora que pedia um segundo disco de versões. A loucura de Ray Charles vendeu em ambos os mercados, o do country e o r&b. Só "I Can't Stop Loving You" vendeu 700 mil cópias em apenas quatro semanas. Willie Nelson viria a dizer que Ray "fez mais pelo country do que qualquer artista". Billy Joel afirmou: "aqui está um preto a oferecer uma música tão branca quanto possível, enquanto a segregação racial vivia os seus tempos mais complicados."



É este primeiro volume que interessa, é a obra de um visionário que compôs um álbum contra e contra todos. O segundo volume é um capricho da editora e o reconhecimento do génio de Ray Charles. 

sábado, 14 de março de 2015

Natalie Prass - Natalie Prass / Matthew E. White - Fresh Blood


A Spacebomb é a editora deste início de 2015. A força advém dos dois álbuns editados neste primeiro trimestre: primeiro foi Natalie Prass com uma muito aplaudida estreia homónima e depois Matthew E. White com o sucessor do excelente Big Inner, marcante disco de 2012. O fio condutor está em White, carismático fundador, líder e cara da editora, também co-produtor do disco de Prass. Há um novo geek na soul, portanto, uma espécie de Mayer Hawthorne com mais 10 quilos de barba. Há nos dois registos um cuidado quase obsessivo com a produção que obriga a audições repetidas e atentas. A estreia de Prass levou três anos a ser editado e a rapariga já não está de coração partido, como estão as letras de Natalie Prass. A reabilitação foi total - ela sobreviveu e as canções também. A voz lembra em momentos distintos Eleanor Friedberger e Joanna Newsom - tudo embrulhado numa grandiosa folk orquestral. Já Matthew E. White, cujo primeiro registo resultou num sucesso inesperado, não repete, claro, a surpresa. Repete, aliás, a fórmula soul, com duas novidades: menos coros épicos e mais gospel. O resultado não é tão deslumbrante como em Big Inner.



quinta-feira, 5 de março de 2015

Jazmine Sullivan - Reality Show


Que figura de estilo está empregue no título do novo álbum de Jazmine Sullivan? Sarcasmo? Metáfora? É um reality show como aqueles que vemos na televisão (afinal de contas é isso que nos mostra a capa) ? É a realidade pura e dura como nos mostram as letras do terceiro de originais da artista que há coisa de quatro anos anunciou um hiato via Twitter: "i'm trying to figure out who I am… w/out a mike, paper or pen. i promised myself when it wasn't fun anymore i wouldn't do it. and here i am."

Respostas? Que se lixem. Este regresso quatro/cinco anos depois e com alguns quilos a mais, está mais do que aprovado. No preciso momento em que saia da cena, na altura do tal tweet, o r&b foi -se transformando através de artistas como Weeknd, Drake ou Frank Ocean. Sullivan não encaixa no estereótipo da diva r&b e este registo é mais uma aproximação a estes nomes. A mutação não é declarada, o que lhe garante um som diferente do que já estamos à espera de ouvir em 2015. Cinco anos depois do tweet encontrou-se.

sexta-feira, 27 de fevereiro de 2015

[Fundo de Catálogo] Bob Dylan - Bob Dylan (1962)


Bob Dylan, ou seja, Dylan Thomas a servir de inspiração para o nome pelo qual Robert Allen Zimmerman haveria de ser reconhecido. O mito começa aqui. John H. Hammond, que dez anos depois haveria de fazer o mesmo com Bruce Springsteen, agarra e leva-o à editora, a Columbia, uma das poucas que não o tinha recusado. Muda-se para Nova Iorque e grava tudo num só take e três tardes - relatos das sessões referem-se a ele como indisciplinado, "não consigo tocar a mesma canção duas vezes seguidas", terá dito. 402 dólares custou Bob Dylan. Não vendeu quase nada (cerca de 500 cópias no Reino Unido, residualmente nos Estados Unidos), mas não terá dado prejuízo. A "Loucura do Hammond", foi assim que o protegido de John H. passou a ser conhecido após o falhanço comercial.



Clássicos folk - ouviu todos os seis discos e cerca de oito horas da compilação Folkways Anthology of American Folk Music - e blues compõe o essencial do reportório. O resto são dois originais escritos pelo próprio, "Talkin' New York" e "Song to Woody". A capa guarda aquelas que talvez sejam as mais interessantes histórias que rodeiam a estreia discográfica de Dylan: a dita coloca a fotografia de Dylan ao contrário, tudo para que a guitarra não tapasse o logo da Columbia Records. A fotografia é de Don Hunstein, na altura o fotógrafo oficial da editora que haveria também de imortalizar as capas de The Freewheelin também de Dylan e Sounds Of Silence dos Simon & Garfunkel. 


Não é o melhor álbum de Dylan, está aliás longe de o ser, é apenas um disco de versões - algo muito valorizado no início dos anos 60, altura em que as covers vendiam mais um artista do que os originais -, mas conserva já o tique que haveria de compor os melhores anos de Dylan: a atitude "não quero saber" que o levou à mudança de som e álbuns propositadamente maus. 

quinta-feira, 5 de fevereiro de 2015

Mark Ronson - Uptown Special


Não é de agora nem vem na sequência de Random Access Memories (RAM) dos Daft Punk. Aliás, vem na sequência de RAM, mas não terá sido essa a grande motivação de Mark Ronson para este quarto álbum a solo. Aliás, Ronson já fazia isto quando os Daft Punk se auto-proclamavam Human After All, ao mesmo tempo que, ironicamente, editavam o seu registo menos humano. Uptown Special é um álbum à Mark Ronson, ou seja, ele pensa o que os outros executam. Neste caso, os outros são o romancista Michael Chabon (nas letras), Bruno Mars (na incrível "Uptown Funk"), Mystical (qual James Brown em "Feel Right") e Kevin Parker (os momentos mais singulares/psicadélicos). Ou seja, Uptown Special é uma vénia à soul, funk, r&b dos anos 60/70 - com Stevie Wonder a fazer a ponte entre esses anos e os de hoje - e o prolongar da interminável lista de contactos do produtor.

quinta-feira, 29 de janeiro de 2015

Capitães da Areia - A Viagem dos Capitães da Areia a bordo do Apolo 70


É uma odisseia no espaço em pleno ano 2015. Uma que só olhando para capas e títulos nos lembra Sgt. Pepper's Lonely Hearts Club Band e 10.000 anos depois entre Vénus e Marte. É mesmo uma odisseia, sim, E, sim, A Viagem dos Capitães da Areia a bordo do Apolo 70 é assim tão ambiciosa. Como qualquer grande odisseia, há duelos de titãs - os Capitão Fausto versus os Capitães da Areia e (melhor, muito melhor) Rui Pregal da Cunha versus Toy - e tem Xungaria. E esta vem do céu e, como sabemos, "no princípio criou Deus o céu e a terra". E o céu é o universo. E o universo é o cenário esta odisseia. O cosmos, esse "lugar perigoso", como explica José Cid "Algures Entre Vénus e Marte", a arder, n'"um lugar ao sol", como o de Miguel Ângelo na capa disto tudo. E depois há os heróis, claro, os heróis como em qualquer odisseia. Heróis do Mar e da Sétima Legião - "Bem-vindos a Portugal", há-de esclarecer Reui Veloso, perdão, Manuel Fúria, lá para o fim. E há momentos que nos lembram outras odisseias intemporais como aquela dos Da Weasel, Amor, Escárnio e Maldizer, com Simão Sabrosa e os Gados Fedorento. Momentos como "Canção-Indigestão", com Bruno Aleixo, "Cintura de Velhinhas", com Tiago Pereira e as velhinhas, ou "A Partida para o Espaço" com frases intemporais. "Rotação e translação, vamos todos para Ibiza!". Siga.

quinta-feira, 22 de janeiro de 2015

Viet Cong - Viet Cong


Voltar a 2005, numa altura em que os Bloc Party e os Franz Ferdinand se estreavam seguindo os ensinamentos dos Gang of Four, mas sem se cingirem à mera função de copistas, e, horas depois, regressar a 2015 para ouvir a estreia dos Viet Cong só pode ser uma feliz coincidência. Mas estes últimos conseguem levar a tarefa ainda mais longe: sem sacrificar o apelo melódico das canções, estes 37 minutos revelam-se muito mais desafiantes que qualquer coisa saída no temporada 2004/2005, esse revivalismo pós-punk que felizmente tinha o tempo contado. E nem era preciso lembrar que o baterista Mike Wallace e o Matt Flegel vêm das cinzas dos Women. 


segunda-feira, 19 de janeiro de 2015

BC Camplight - How To Die in the North


Já ninguém dava nada por Brian Christinzio. Depois de dois discos fantasma, de 2005 e 2007, o homem retirou-se e mudou de cidade e país, de Philadelphia para Manchester. Em Inglaterra, num pub, terá sido encorajado por um conjunto de músicos locais a regressar à música que lhe tinha dado em reconhecimento artístico aquilo que faltou no comercial. Muito do que se passa em How To Die in the North está no vídeo promocional de "Just Because I Love You": nada de novo - o disco é, aliás, muito nostálgico -, mas um mais do mesmo (ecos de outro Brian, o Wilson, e soul setentista) que não nos largará ao longo dos próximos meses. Viciante.

sábado, 17 de janeiro de 2015

TUT - Preacher's Son


Entre Deus e o pecado, a fé e a razão, o milagre e a tentação. Preacher's Son passeia-se neste limbo que está entre as ruas e a igreja, sendo TUT o filho do pastor. Abre com o relato do aumento do crime nas ruas de Chattanooga, Tennessee, e sampla em "Sunday Morning", penúltima faixa, um culto de Domingo de manhã. A impecável produção jazzy e um grupo em comum (The House), valem-lhe algumas comparações com o conterrâneo Isaiah Rashad, com quem fecha o álbum numa colaboração na sarcástica "Sunday Service". Lembramo-nos também de Chance The Rapper. Viva 2015!


terça-feira, 6 de janeiro de 2015

Death Grips - Fashion Week


A primeira grande edição surpresa de 2015 não é assim tão surpreendente. Desde 2011, com Exmilitary que os Death Grips nos habituaram a esperar apenas o inesperado. Na altura tudo soava provocação, caos, uma articulada e pertinente manifestação anti-capitalismo, de punho fechado. O timing era perfeito, a crise financeiras, o movimento Occupy, a Primavera Árabe. Depois de Niggas on the Moon, mais do mesmo, mais rap apunkalhado contra tudo e contra todos, mas sem metade do entusiasmo, anunciavam o fim. Mais um truque? Aparentemente. Fashion Week balança-se entre aquilo que nunca vamos ouvir em Milão ou Paris e alguns instrumentais que encaixam na semana da moda. As canções chamam-se todas "Runaway" mais uma letra do alfabeto - todas juntas criam uma espécie de código: "Jenny Death When". Em Fevereiro há mais. Depois: o fim? 

quinta-feira, 1 de janeiro de 2015

Os nossos 28 melhores álbuns de 2014


Há várias razões para que as listas do À Perfeita Repetição só sejam realizadas em Janeiro. Um: o ano só terminou hoje. Dois: os balanços só se fazem das 23h59 para a frente não vá um D' Angelo editar uma obra-prima que nos faça arrepender de não ter esperado mais uma semanas. Três: ouvem-se discos até ao dia 31 de Dezembro - o ritmo de edições anual é cada vez mais difícil de acompanhar. Top de 27 álbuns de 2014 em 2015:

1 - Run the Jewels - Run the Jewels II
2 - Vince Staples - Hell Can Wait EP
3 - Sleaford Mods - Divide and Exit
4 - cLIPPINg - CLPPNG
5 - Ariel Pink - Pom Pom
6 - Madlib & Freddie Gibbs - Piñata
7 - Angel Olsen - Burn Your Fire for No Witness
8 - War on Drugs - Lost in a Dream
9 - St. Vincent - St. Vincent
10 - Capicua - Sereia Louca
11 - Pearls Negras - Biggie Apple
12 - Wild Beasts - Present Tense
13 - Shamir - Northtown
14 - Tinashe - Aquarius
15 - Kelis - Food
16 - Perfume Genius - Too Bright
17 - Banda do Mar - Banda do Mar
18 - Real State - Atlas
19 - How To Dress Well - "What is this heart?"
20 - Sinkane - Mean Love
21 - Lykke Li - I Never Learn
22 - Amen Dunes - Love
23 - Fatima - Yellow Memories 
24 - Big Freedia - Just Be Free
25 - Crioulo - Convoque Seu Buda
26 - Mac DeMarco - Salad Days
27 - Capitão Fausto - Pesar o Sol
28 - Woods - With Light and Love