segunda-feira, 16 de março de 2015

[Fundo de Catálogo] Ray Charles - Modern Sounds in Country and Western Music (1962)


Não é o primeiro álbum de Ray Charles para a ABC-Paramount Records, mas é o primeiro em que se faz valer da cláusula que defende a sua total liberdade criativa. A editora chumbou um disco de versões country, mas Ray agarrou-se à tal clausula e, apesar das tentativas da editora, avançou para aquele que é, muito provavelmente, o álbum mais importante da sua carreira.



Um álbum country na voz de um preto, em plena luta pelos direitos civis? O antecipado suicídio comercial acabou por resultar num marco nas lutas dos negros nos anos 60. Cada som tem uma raça, diziam-lhe. E ele discordava. Hoje é fácil dar-lhe razão, mas em 1962 ainda não tinha passado meia década desde que Chuck Berry perdeu a sua base de fãs branca, no momento em que a mesma descobriu que aquele tipo com voz de branco era afinal um negro.



A pergunta mantém-se: um disco de versões country em 62? Calma, são versões country com roupagens jazz, gospel e r&b. Resultou tão bem que, três meses e 500 mil cópias vendidas depois, era a editora que pedia um segundo disco de versões. A loucura de Ray Charles vendeu em ambos os mercados, o do country e o r&b. Só "I Can't Stop Loving You" vendeu 700 mil cópias em apenas quatro semanas. Willie Nelson viria a dizer que Ray "fez mais pelo country do que qualquer artista". Billy Joel afirmou: "aqui está um preto a oferecer uma música tão branca quanto possível, enquanto a segregação racial vivia os seus tempos mais complicados."



É este primeiro volume que interessa, é a obra de um visionário que compôs um álbum contra e contra todos. O segundo volume é um capricho da editora e o reconhecimento do génio de Ray Charles. 

sábado, 14 de março de 2015

Natalie Prass - Natalie Prass / Matthew E. White - Fresh Blood


A Spacebomb é a editora deste início de 2015. A força advém dos dois álbuns editados neste primeiro trimestre: primeiro foi Natalie Prass com uma muito aplaudida estreia homónima e depois Matthew E. White com o sucessor do excelente Big Inner, marcante disco de 2012. O fio condutor está em White, carismático fundador, líder e cara da editora, também co-produtor do disco de Prass. Há um novo geek na soul, portanto, uma espécie de Mayer Hawthorne com mais 10 quilos de barba. Há nos dois registos um cuidado quase obsessivo com a produção que obriga a audições repetidas e atentas. A estreia de Prass levou três anos a ser editado e a rapariga já não está de coração partido, como estão as letras de Natalie Prass. A reabilitação foi total - ela sobreviveu e as canções também. A voz lembra em momentos distintos Eleanor Friedberger e Joanna Newsom - tudo embrulhado numa grandiosa folk orquestral. Já Matthew E. White, cujo primeiro registo resultou num sucesso inesperado, não repete, claro, a surpresa. Repete, aliás, a fórmula soul, com duas novidades: menos coros épicos e mais gospel. O resultado não é tão deslumbrante como em Big Inner.



quinta-feira, 5 de março de 2015

Jazmine Sullivan - Reality Show


Que figura de estilo está empregue no título do novo álbum de Jazmine Sullivan? Sarcasmo? Metáfora? É um reality show como aqueles que vemos na televisão (afinal de contas é isso que nos mostra a capa) ? É a realidade pura e dura como nos mostram as letras do terceiro de originais da artista que há coisa de quatro anos anunciou um hiato via Twitter: "i'm trying to figure out who I am… w/out a mike, paper or pen. i promised myself when it wasn't fun anymore i wouldn't do it. and here i am."

Respostas? Que se lixem. Este regresso quatro/cinco anos depois e com alguns quilos a mais, está mais do que aprovado. No preciso momento em que saia da cena, na altura do tal tweet, o r&b foi -se transformando através de artistas como Weeknd, Drake ou Frank Ocean. Sullivan não encaixa no estereótipo da diva r&b e este registo é mais uma aproximação a estes nomes. A mutação não é declarada, o que lhe garante um som diferente do que já estamos à espera de ouvir em 2015. Cinco anos depois do tweet encontrou-se.