domingo, 13 de novembro de 2016

[Fundo de Catálogo] James Carr - You Got My Mind Messed Up (1966)


A maior injustiça saída de 1966? You Got My Mind Messed Up, de James Carr, continuar a ser um disco de poucos e ser, no mínimo, tão bom como Blue otis, de 65. Uma obra-prima, um dos melhores discos soul de sempre e logo à primeira. Não fosse uma doença bipolar e certamente teria conquistado o mundo. É verdade que a sua tragédia é diferente da de Otis, mas é soul perdeu duas das suas melhores vozes de sempre de forma absolutamente dramática.

sábado, 12 de novembro de 2016

[Fundo de Catálogo] Cream - Fresh Cream (1966)


Os Cream enganaram-nos bem. Fizeram-nos acreditar na fórmula dos super grupos. Que bastava juntar uma série de grandes músicos que estes retribuíam com grandes canções, enormes álbuns. Entretanto, falhanço após falhanço nos ingredientes aprendemos a dar ainda mais valor ao primeiro super grupo da história, o que foi composto por Ginger Baker, Jack Bruce e Eric Clapton. Num ano em que só dava rock 'n' roll e psicadelismo, os Cream criam outra coisa e, como consequência, foram os primeiros em muitas coisas: os primeiros power-trio, os primeiros a colar ao guitarrista o sufixo "hero" e a criar um disco hard rock . Estão aqui as raízes mais profundas do heavy metal.

[Fundo de Catálogo] Love - Da Capo (1966)


Mais uma banda a picar o ponto na novíssima cena psicadélica. E porque não? O segundo disco dos Love ainda não é Forever Changes, mas já nos explica o fascínio de várias bandas punk pela banda de Arthur Lee: "Seven and Seven is" pode muito bem ser classificada como primeira canção punk de sempre. Da Capo significa muitas mudanças: na sonoridade, no alinhamento (Michael Stuart passa a ser o baterista e Alban "Snoopy Pfisterer passa a ocupar-se do harpsicord e orgão) e na direcção. Têm um Lado A composto por seis canções e, à imagem de Dylan e dos Mothers of Invention, uma única faixa no Lado B. É aí que caem mais claramente no caldeirão psicadélico. 


sexta-feira, 11 de novembro de 2016

[Fundo de Catálogo] The Kinks - Face To Face (1966)


Embora seja mais celebrado como eventual primeiro álbum conceptual da história, Face to Face dos Kinks é mais uma quase perfeita colecção de canções, muito à imagem de Rubber Soul dos Beatles ("Party Line", aliás, poderia lá estar). Ou, como diria Brian Wilson, um disco sem canções para encher. Ray Davies a atingir a maturidade enquanto escritor de canções, embora anos depois de "You Really Got Me". Numa altura em que toda a gente se virava para a corrente psicadélica, só um disco de canções perfeitas para nos chamar a atenção e ficar bem na história discográfica de 66. 

quinta-feira, 10 de novembro de 2016

[Fundo de Catálogo] 13th Floor Elevators - The Psychedelic Sounds of the 13th Floor Elevators (1966)


Mas afinal quem inventou o psicadelismo enquanto definição de um som? Uns dizem que foram os Beach Boys, outros apontam os Mothers of Invention, outros os Beatles, outros ainda os Byrds. Mas parece existir consenso na hora de apontar os 13th Floor Elevators como fundadores do género, o que só pode ser gancho histórico, pois a estreia discográfica só surge depois de todos os nomes enumerados lá em cima terem picado o ponto. Como já dissemos anteriormente, não existirá uma banda a servir de pai ao género psicadélico, mas sim um pai materializado no LSD que ajudou a dar à luz vários filhos. 

Mas se a paternidade se deve à droga, a educação, essa, acaba por ditar comportamentos diferentes e oferecer histórias interessantes. A dos 13th Floor Elevators passa por beber das jug bands, indo buscr o instrumento que lhes dá nome e modelar-lhe o uso criando efeitos na voz. E essa é a grande novidade dos 13th Floor Elevators: um som vocal distinto que nos acompanha ao longo de 11 faixas. Para além, claro, de serem os primeiros a casar garage com psicadeleismo e surf rock. Têm também o mérito de fazer a primeira associação directa de sempre de música a psicadelismo: é olhar para o título.

quarta-feira, 9 de novembro de 2016

[Fundo de Catálogo] Simon & Garfunkel - Parsley, Sage, Rosemary and Thyme (1966)


Despachemos a incoerência: o terceiro disco de Simon & Garfunkel sai apenas nove meses depois de Sound of Silence, disco apressado, mas editado uns 18 longos meses depois da estreia Wednesday Morning, 3 A.M. À imagem de Pet Sounds, este Parsley, Sage, Rosemary and Thyme custou uma fortuna em 66, ano pouco habituado a estes valores: 30 mil dólares, 219,169 dólares na conversão para 2016. E, tal como Beach Boys e Beatles, o duo tinha controlo total naquilo que se fazia em estúdio. A inclusão de instrumentos como o harpsichord e bongo permitem estabelecer mais um paralelo com os clássicos que vinham da Califórnia e de Liverpool.

Um ano depois da visita a Inglaterra, Simon continua fascinado. É o título do disco, é a faixa de abertura, são as canções ressuscitadas de The Paul Simon Songbook, disco declaradamente inspirado por terras de Sua Majestade. E há curiosidades como "The Big Bright Green Pleasure Machine", uma crítica à publicidade televisiva, "A Simple Desultory Philippic", uma paródia a Bob Dylan, a assumida grande inspiração de Simon, e "7 'O Clock News/Silent Night", magnífica sátira que é uma síntese de 1966 em que a canção de natal é acompanhada de Charlie O'Donnell, apresentador de notícias que dá conta da overdose do comediante Lenny Bruce, o Chicago Freedom Movement liderado por Martin Luther King e protestos anti-Vietname. 

Muito provavelmente, a obra maior do duo. 

segunda-feira, 7 de novembro de 2016

[Fundo de Catálogo] The Mamas and The Papas - The Mamas and The Papas (1966)


O início e o fim dos The Mamas and the Papas é sintomático: na temporada 66/67, as coisas aconteceram a uma velocidade sem qualquer paralelo na história da música pop. No caso da banda de São Francisco, metáfora perfeita para o ano em que aconteceram, entre Fevereiro (mês da estreia) e Agosto (mês deste segundo objecto de originais), Michelle Philips, mulher do principal compositor John Philips, é expulsa na sequência de dois casos: um já tinha sido perdoado em 65 e envolveu Denny Doherty, o outro elemento masculino da banda. O outro, já de 66, colocou Gene Clark, um dos Byrds, como protagonista. A banda implodia, mas resistiu até este homónimo: Jill Gibson,  mulher do produtor Lou Adler (grande prova de confiança!), voz próxima da banda substitui e, cara bonita por cara bonita, a qualidade das harmonias não se perde e o som parece aproximar-se mais da soul (certo, há uma cover de Martha & The Vendettas) e há uma canção que se aproxima de níveis oníricos até aí pouco experimentados. Para a história fica a alegada presença de Ray Manzarek (com os Doors a meses de darem o seu salto) logo na faixa de abertura com um orgão à "Like a Rolling Stone". Para os interessados, a capa também dá  uma novela engraçada.

sábado, 5 de novembro de 2016

[Fundo de Catálogo] Donovan - Sunshine Superman (1966)


Mais um que caiu no caldeirão psicadélico, não é? Na segunda metade de 66, as quedas os tropeções eram cada vez mais recorrentes e a Aldeia Gaulesa parecia cada vez mais global Até Sunshine Superman, Donovan era tratado como um disciplino (pelos mais simpáticos) ou copista (pelos mais hostis) de Dylan. E percebe-se: a folk, a veia poética, o facto de ter aparecido bem mais tarde, já em 65, três anos depois de Bob Dylan. Mas, vá, depois de Dylan, todos chegam atrasados, de Donovan a Jake Bugg ou, para usarmos um nome mais consensual, Devendra Banhart. O maior elogio que podemos fazer a Donovan é esse: depois de Dylan, todos são Donovans, o escocês que melhor se fazia passar por americano. 

Os Beatles e os Stones tinham-nos introduzido ao som oriental da sitar, mas Donovan usa e abusa do instrumento indiano. Nada que, aliado ao consumo de LSD, surpreenda: Donovan era próximo dos Beatles e de Brian Jones. A droga está omnipresente nas letras e, aliás, a introdução de LSD no copo de uma namorada, Sue Lyon, a Lolita de Kubrick, fez com que a relação chegasse ao fim. 

Alguns apontamentos retirados durante a audição de Sunshine Superman, conclusões nossas: 

- Donovan seria mais obcecado por "velvet" (veludo) do que David Lynch: são três as referências que contámos nestas dez canções;
- Este será um disco muito importante para meninos como os Decemberists que recriam os contos e as histórias e fábulas medievais;

sexta-feira, 4 de novembro de 2016

[Fundo de Catálogo] The Beatles - Revolver (1966)


É tido como um dos melhores discos de sempre, mas vamos considerá-lo antes de mais um dos discos mais livres de sempre. Porque rompe com tudo o que tinha sido feito anteriormente, porque manda o totalitarismo editorial dar uma volta. Sim, é verdade que, como já vimos anteriormente neste blogue, o psicadelismo já tinha tido vários inícios, mas com Revolver é seguro dizer que o modelo psicadélico chega à sua idade adulta. Bem, na verdade nada é seguro em Revolver. Pet Sounds é magnífico, mas é outra coisa. Mesmo Rubber Soul, embora Harrison tenha dito que não via grandes diferenças entre os dois discos, sendo que, para o Beatle, o disco de 1965 era o Volume Um e este o Volume Dois. 

O sétimo dos Beatles marca a preponderância de Lennon em relação a um McCartney baladeiro, perfeito para os Beatles anteriores, menos presente nestes que iam experimentando LSD. Mas Lennon não estava só, Harrison era companhia para as trips e ganhava espaço: três das 14 canções são dele. Lennon materializa as tais trips e acaba por confessar-se: "Beatles are bigger than Jesus". Caldo entornado, a América não lhe perdoa as palavras e faz o que pode: queima os discos. Vale-lhes que essa América não é a mesma América que inspiraram e que tanto os inspirava, ou seja, Beach Boys, Motown/Stax, Dylan. 

Robert Rodriguez, autor entre outras obras de Revolver How the Beatles Reimagined Rock'n'Roll, diz que Revolver criou, nas suas 14 faixas, todos os outros géneros da pop, da  electrónica ao punk, passando pela world music. Acrescentamos que só não terão inventado a soul e o r&b pois já tinham sido inventados. Bem-vindos à era psicadélica.

quarta-feira, 2 de novembro de 2016

[Fundo de Catálogo] The Byrds - Fifth Dimension (1966)


Dizem eles que o psicadelismo começa com este Fifh Dimension dos Byrds. A ideia não estará errada, mas apenas incompleta. É difícil encontrar um disco que tenha dado o tiro de partida para a desenfreada correria que haveria de se seguir. Há Rubber Soul dos Beatles, há Pet Sounds dos  Beach Boys, há Freak Out! dos Mothers of Invention, há Roger the Engineer dos Yardbirds e há, claro, este terceiro registo de uns Byrds já sei Gene Clark o principal compositor dos dois antecessores, pretexto ideal para avançar para a mudança, algo que em 1966 acontecia quase todos os dias. 

Em tempos de expansão espacial e em que o LSD era, passe o exagero e a provocação, mais popular que os Beatles, os Byrds exploram os efeitos da droga criada por Albert Hofmann e o paradoxo que é o seu fascínio pela vida extraterrestre e uma banda de elementos assumidamente cristãos. Da faixa título, as teorias ramificam-se entre os que referem que é uma canção sobre drogas e os que defendem que é uma tentativa de explicar a teoria da relatividade de Einstein, "Mr. Spacemen" é precursora do space-rock e "Eight Miles High" foi influenciada por John Coltrane.  

Ah, e adeus folk-rock. Mais ou menos.

segunda-feira, 31 de outubro de 2016

[Fundo de Catálogo] The Mothers of Invention - Freak Out! (1966)


Se estudássemos uma disciplina chamada Frank Zappa e o primeiro teste se concentrasse no álbum de estreia dos Mothers of Invention, Freak Out!  eis uma proposta de pergunta e resposta simples:  

- Este é o primeiro disco psicadélico da história? Também.

- É o melhor álbum de Zappa? Claro que não.

- É o mais importante? Um dos...

Estávamos em 1966 e a história do rock mudava a cada mês, no anterior Dylan tinha incluído canções de quase 12 minutos em Blonde on Blonde no mesmo dia em que Brial Wilson e os Beach Boys mudaram a história da produção discográfica com Pet Sounds. Frank Zappa voltava a baralhar a história da pop. E baralhava com um disco de quatro lados (novidade absoluta) e conceptual sobre a América: o Vietname, os Tumultos de Watts e, consequentemente, os direitos civis, o jornalismo, até Elvis Presley.


A história é digna dos clássicos: Tom Wilson, homem experiente que já tinha produzido Dylan e Simon & Garfunkel, assina-os convencido que são uma "white blues band". Wilson, ao contrário de quase toda a gente rodeava outro Wilson, o Brian dos Beach Boys, abraçou a diferença e acreditou que esta fritaria poderia ser marcante. Terá gasto uma fortuna e arriscado o emprego, isto numa altura em que a paranóia, o invulgar e a diferença supostamente não pagavam contas. Mas nem tudo é difícil em Freak Out!: há doo-wop e canções como "Go Cry On Someone Else's  Shoulder" que só no cinismo e idiossincrasias de Zappa diferia do que uma data de grupos r&b e soul iam fazendo em editoras como a Motown ou a Stax.

Disco de culto, pioneiro naquilo a que se convencionou chamar de avant-garde.

 

domingo, 30 de outubro de 2016

[Fundo de Catálogo] The Beach Boys - Pet Sounds (1966)


A quente, pode parecer difícil compreender o espanto dos outros quatro Beach Boys quando regressam de mais uma digressão, desta feita sem Brian Wilson, e encontram o rato de laboratório à volta das canções que viriam a resultar em Pet Sounds. Afinal de contas, as pistas já estão todas em Today!, disco de transição cuja primeira metade faz a ponte para a idade adulta da banda. Mas analisemos a coisa a frio: ninguém tinha escrito e realizado nada assim. Nem Phil Spector, a grande inspiração de Wilson. Nem os Beatles de Rubber Soul, a grande inspiração de Pet Sounds. Embora o sexto disco dos britânicos já representasse um passo em frente em relação aos demais, são os Beach Boys de Pet Sounds que levam a produção rock 'n' roll até onde esta nunca tinha ido, mesmo em valores monetários: o registo terá custado $70,000, o equivalente a mais de $500,000 de hoje.



Pet Sounds é a primeira vez que se questiona a indústria: é um disco que não vai à procura do público, mas é o público que tem que ir ao seu encontro e dedicar-lhe tempo. Na altura não vendeu tanto como os anteriores e foi melhor recebido no Reino Unido. Parte de uma premissa muito simples, mas de execução complexa: fazer algo incrível, sem canções para encher, algo que durasse pelo menos dez anos, "algo muito bom como o que fez Phil Spector", explicou mais tarde Brian Wilson. É daqui que vem uma ideia de álbum conceptual, o primeiro registo acidentalmente conceptual, uma obra reconhecida pela produção inovadora. Para concretizar as suas ideias, Wilson equacionou levar um cavalo para estúdio e levou mesmo cães, comboios, campainhas de bicicleta, latas de coca-cola, garrafas de água, theremin, acordeão, bongo, ukulele, enfim, uma catrefada de coisas que ninguém a não ser o próprio poderiam ter antecipado. Eventualmente, o psicadelismo conhece aqui o seu ano zero. Entretanto, o homem ia cosendo as letras que Tony Asher, rapaz que Wilson tinha conhecido em 65 e que tinha criado vários jingles para uma agência de publicidade, ia escrevendo.

Quando lhe dizem que Pet Sounds é o melhor álbum de sempre, ele responde que o seu melhor álbum de sempre é Christmas Album, uma compilação da autoria de Phil Spector.

segunda-feira, 24 de outubro de 2016

[Fundo de Catálogo] Bob Dylan - Blonde on Blonde (1966)


Pode concordar-se ou não com a atribuição, mas qualquer discussão que passe pelo Nobel deve incluir Blonde on Blonde, talvez o  mais desconcertante álbum da discografia de Dylan. Ainda hoje lemos várias teorias acerca das canções, a começar na aparentemente mais descomplexada ("Rainy Day Women #12 & 35") a terminar na mais mais completa ("Visions of Johanna"). E sim, quando referimos "completa" também referimo-lo a um nível quase literário.

A história dá-nos o parto de Blonde on Blonde como o mais atribulado do escritor (já podemos?) até aí. Começou em Nova Iorque no Outono de 65, terminaram em Nashville, no Inverno de 66. Da primeira sessão só resultou uma canção: "One of Us Must Know (sooner or later)". Não era bloqueio criativo, as coisas é que não saíam como na cabeça de Dylan. Mais tarde, em 78, numa celebre entrevista, constataria: "the closest I ever got to the sound I hear in my mind...", referindo-se a Blonde on Blonde

É o produtor Bob Johnston que aborrece o manager Albert Grossman, este último é terminantemente contra a transferência de estúdios. Mas Dylan é quem manda e aceita a mudança. Para o Tenesse levou músicos que acataram tudo o que a vontade de Dylan ditava, ou seja, deixou aquilo que viria a ser a The Band, os The Hawks, na Big Apple. É esta a história de Blonde on Blonde: A vontade de Dylan antes da dos demais. 

Completando a trilogia começada por Bringing It All Back Home e Highway 61 Revisited, Blonde on Blonde oferece o mais complexo texto lírico da música pop até então (até hoje?). Descrições, metáforas, mudanças de direcção, inúmeras personagens (vagabundos, prostitutas, vendedores ambulantes,políticos bêbados, persas bêbados, vendedores de trapos, senadores, filhos de senadores, pregadores, etc. Letras sobre drogas que são sobre o livro de Actos (Bíblia) que são sobre os direitos civis que são sobre uma canção de Ray Charles que são sobre o evento de Newport Festival. Chama-se "Rainy Day #12 & #35" e, embora possa ser considerada a mais facilmente descartável, não é tão tonta como alguns a quiseram pintar. 

À polémica do Newport Festival juntam-se agora a das drogas ("Rainy Day Women #12 & #35, "Visions of Johanna" e "Just Like a Woman", por exemplo) e a misoginia ("Just Like a Woman"). Interpretações. Está na forma como deixa em aberto todas estas canções boa parte do fascínio de Dylan no geral e de Blonde on Blonde no particular. E essa "4th Time Around" em que parodia (?) John Lennon e os Beatles com a melodia de "Norwegian Wood"? Interpretações, uma vez mais. Lennon considerou-a uma provocação. Afinal de contas, o Beatle não fazia muito por esconder a influência do músico do Minnesota. 

Dylan tinha casado há três meses, mas até "Sad-Eyed Lady of the Lowlands" não havia testemunhas em formato canção. O épico de 11 minutos que fecha o registo desculpa tudo. Foi o primeiro disco duplo que a pop nos ofereceu. Não admira que não existam muitos grandes discos duplos, tal é a fasquia colocada desde 1966.

sexta-feira, 21 de outubro de 2016

[Fundo de Catálogo] The Rolling Stones - Aftermath (1966)


Embora seja muitas vezes celebrado por ser o primeiro álbum composto exclusivamente por composições da dupla Jagger/Richards, a grande influência sobre Aftermath talvez tenha que ser concedida a Brian Jones. Enquanto os restantes andavam à boleia da obra dos Beatles, Jones passava tempo com um deles, George Harrison, ele que lhe terá mostrado todos os instrumentos fora do comum que aqui encontramos: sitar, marimba e koto. E é só por isso que este é o primeiro álbum dos Stones que nos obriga a parar para ouvir com redobrada atenção. Há ali um baixo fuzz, acolá um ou outro pormenor que foge ao padrão blues-rock dos primeiros registos, mas nada como os toques instrumentais introduzidos por Jones. 



Era para ser a banda sonora de um filme que nunca existiu provisoriamente chamado Back, Behind And in Front. Acabaria por não avançar, por alegada falta de entendimento entre Mick Jagger e o potencial realizador, Nicholas Ray. O vocalista não terá apreciado o homem de Johnny Guitar. É um corte do passado, o abraçar da provocação e às drogas: algumas canções, "Stupid Girl" e "Under My Thumb" à cabeça, irritaram movimentos feministas com alegadas tiradas misóginas.


A versão britânica ultrapassa os 50 minutos e aí já não é apenas um corte com o passado do grupo, mas com o de toda a industria. 

terça-feira, 18 de outubro de 2016

[Fundo de Catálogo] The Mamas & The Papas - If You Can Believe Your Ears and Eyes (1966)


No que diz respeito às harmonias e predilecção do estúdio e desdém pela estrada, o génio de John Phillips só encontrará paralelo no de Brian Wilson. O que os Mamas and The Papas fizeram a nível harmónico, como obra definitiva, só poderá ser comparado a Pet Sounds. Aliás, a estreia apressada da banda Californiana encontra inspiração em Rubber Soul, dos Beatles, e na segunda metade de Today!, dos Beach Boys. Mas foquemo-nos então em Março de 66: a Califórnia hospedava o movimento que ainda hoje serve de farol para o que aconteceu nos anos 60: o hippie. If You Can Believe Your Ears and Eyes é peça central para compreender o que se passava na Costa Oeste, no geral, e na Califórnia, no particular. 

A adoração de Philips e Wilson pelo estúdio coloca-nos num outro momento de transição: os músicos que começam a trabalhar para o estúdio e preterem a estrada. Até à temporada 65/66 o caminho era o inverso. Phil Spector, também ele figura central nesta transformação, ia abanando as coisas e também ele merece a sua homenagem em "Spanish Harlem". Para além, claro, do tão celebrado Wall of sound que surge logo a abrir, com "Monday, Monday". O apontamento final vai para a capa que foi banida não por colocar todos os membros da banda, embora vestidos, na mesma banheira, mas pela presença de um lavatório. Ah, sim, e "California Dreamin'", sim, grande canção!

sexta-feira, 14 de outubro de 2016

[Fundo de Catálogo] The Monks - Black Monk Time (1966)


Eis os Torquays, uma banda composta por cinco soldados norte-americanos que, em pleno oeste alemão formaram uma banda para desabafarem. Nasceram em 1964 e editaram um single no mesmo ano. Oh, que se lixem os Torquays! Mais uma banda tipo Beatles? Os Monks substituíram-lhes o nome e a direcção e, embora só tenham durado um disco, influenciaram quase tudo o que veio a seguir. De banda tipo Beatles tornaram-se nuns anti-Beatles numa altura em que os próprios Beatles se tornavam anti-Beatles. Raparam parte da cabeça como os monges e vestiram-se como tal. A música era refrescante, mas, como algumas das melhores histórias da pop, ninguém o percebeu na altura. Influenciaram a aparição do punk e do krautrock (recorde-se, o disco foi apenas editado na Alemanha). Não é que se a sua música quebrasse totalmente com o cânone americano, usavam um banjo electrificado, por exemplo, e, no final do dia, Black Monk Time é apenas mais um disco de r&b, mas um diferente, com uma outra coisa que era nova na altura: o feedback que encontraram de forma acidental e incorporaram na sua música. As próprias letras, despidas e idiossincráticas, eram especiais, diferentes de tudo o que se ia fazendo.


Enquanto Torquays não venderam nada, enquanto Monks também não venderam nada, mas, a par dos Velvet Underground, tornaram-se numa das mais influentes bandas de sempre que menos discos vendeu. Black Monk Time terá influenciado toda a gente: Mark E. Smith (Fall), Beastie Boys, Jack White, Colin Greenwood (Radiohead) e até os Horrors.

terça-feira, 4 de outubro de 2016

[Fundo de Catálogo] Simon & Garfunkel - Sounds of Silence (1966)



18 meses na década de 60, mesmo com a estreia a solo de Paul Simon pelo meio, é uma eternidade, mas é esta a distância temporal que separa o primeiro do segundo discos de Simon & Garfunkel. E esta ideia é importante porque, numa altura em que as mudanças aconteciam a uma velocidade estonteante, o folk-rock explodiu com os Byrds, Dylan e até os Beatles. Sounds of Silence está mais perto dos primeiros, mas bebe claramente dos outros - Paul Simon chegou a dizer que a admiração era tanta que tinha que se esforçar para não imitar Dylan. Mas basta ouvir estas harmonias para nos afastarmos do homem de "Mr. Tambourine Man". A canção título é a materialização dessa nova roupagem: Tom Wilson, o produtor, chamou vários músicos para uma sessão que regravou "Sound of Silence", vieram Joe Mack, Buddy Salzman, Vinnie Bell e Al Gorgoni. A canção folk transformou-se em canção folk-rock e a canção folk-rock tornou-se um clássico intemporal. 18 meses passaram entre 1964 e Janeiro de 1966. Mas a pressão (ou ausência dela) estava do lado do duo: o primeiro disco tinha vendido cerca de duas mil cópias. Era quase como se não existissem. A partir daqui, nunca mais o mundo os conseguiu ignorar.

sábado, 11 de junho de 2016

[Fundo de Catálogo] Beatles - Rubber Soul (1965)


Rubber Soul é o disco que muda tudo. E não nos referimos apenas aos Beatles, este será o álbum mais importante do grupo, tem o condão de despertar a concorrência e a música pop. A partir de Janeiro de 66 nada mais será igual. Referimo-nos a Brian Wilson, claro, mas não só. Em 65, o 6º álbum dos fab four passa a ser barómetro. Mas a relação é reciproca, os Beatles não teriam chegado a Rubber Soul sem os Byrds ou Dylan. Estes e outros, como The Who e Rolling Stones, juntam-se a Wilson nesse louvor mascarado de inveja. 


Esta é a fase da marijuana e pré-LSD, é o momento dos Beatles criarem algo maior. E começa na forma como canibalizam as influências de várias culturas: a importação de motivos orientais para a música ocidental, com a sitar em "Norwegian Wood" - influência de Roger McGuinn e David Crosby dos Byrds, eles, amigos de Harrison. Mas há mais: a chanson em "Michelle", uma das canções mais celebradas, e, claro, a influência norte-americana, de Bob Dylan no lado mais folk e de alguma soul que nesta altura ia dominando os tops. 


Estes são os Beatles a abrirem-se ao mundo e às drogas. Provavelmente, o melhor disco pop até 1965.

sábado, 4 de junho de 2016

[Fundo de Catálogo] Otis Redding - Blue Otis (1965)


Pode um disco de versões ser um dos melhores de todos os tempos? Pode, se cada interpretação garantir a si mesma uma nova identidade, se cada canção colocar a superioridade do original em questão. Aqui há uns dias, no carro, ouvia-se o Roleta Russa na Radar. Não nos lembramos do convidado, mas recordamos a pergunta: "conseguem dizer-nos uma interpretação que supere o original?". Resposta: "bem, podem não concordar, mas "(I Can't Get No) Satisfaction" dos Rolling Stones, pelo Otis Redding. Otis Blue é isto, canções que, eventualmente, terão superado os originais.



Há quem diga que não há melhor disco de soul nos anos 60, há quem vá mais longe e diga que não há melhor disco soul em todo o sempre. O miúdo que deixou os tipos da Stax boquiabertos atingia a maturidade com um registo que, como grande parte dos discos da altura, foi gravado em tempo relâmpago: 24 horas, mais coisa menos coisa. É verdade que músicos como Steve Cropper, Donald Dunn, Al Jackson Jr. (todos dos Booker T & MGs) e Isaac Hayes ajudam, mas, por norma, colocamos o talento desses músicos ao serviço de Redding, mas está reportado que a própria banda admitia que o interprete os levava para um outro nível. 


Sam Cooke tinha falecido no dia 11 de Dezembro de 64. Coincidência: ironicamente, Otis acabaria por morrer no dia 10 de Dezembro de 67, exactamente três anos depois da sua referência maior. 

sexta-feira, 3 de junho de 2016

[Fundo de Catálogo] Bob Dylan - Highway 61 Revisited (1965)

Sabíamos que Dylan (e, consequentemente, o mundo) estava a mudar. A forma como ligou Bringing It All Back Home à corrente é sintomática. Meio acústico, meio eléctrico, Dylan anuncia aquela que viria a ser a grande metamorfose da sua carreira - entretanto, no mês anterior, chocara o público do Newport Folk Festival com um set generosamente ligado à corrente. Enfim, a história está mais do que batida, não vamos dizer que, de um lado estavam os chatos dos fãs acústicos, do outro os que adivinham ali o homem que ia mudar isto tudo. Também sabemos que Robert Allen Zimmerman tinha ganho sensibilidade política com os pais de ex-namorava Suze Rotolo, entre 61 e 64. Não admira que este Highway 61 Revisited se foque tanto na análise social e política, aliado a um som inevitavelmente mais bruto. Este é o seu primeiro disco quase 100 por cento rock.



A história da Estrada que protagoniza o 6º álbum do músico guarda alguns factos e mitos. Foi por aqui que nasceram e/ou viveram Muddy Waters, Son House, Elvis e Charley Patton. Bessie Smith faleceu aqui e, diz a lenda,  que foi no cruzamento da 61 com a Route 59 que Robert Johnson vendeu a alma ao diabo. E, claro, é também a estrada que levava à casa de Dylan. A gravação não terá sido pacífica, com Dylan a equacionar desistir disto tudo. Imaginem, um mundo sem Dylan. É possível? Mas, vá, depois chegou a "Like a Rolling Stone" e voltou a sentir que teria que fazer disto vida. Como não concordar? "Like a Rolling Stone", a abrir, rivaliza em ambição com a última "Desolation Row", canção de 11 minutos, imagine-se. Um name dropping de 11 (!!) minutos em 1965, num disco rock? Ou louco, ou génio ou as duas coisas. 


Nesta altura, independentemente das críticas à electrização, cada disco era melhor que o anterior.

terça-feira, 31 de maio de 2016

[Fundo de Catálogo] The Beatles - Help! (1965)


Seria muito injusto descrever Help! apenas como "banda sonora" ou o álbum de "Yesterday", aparentemente a canção que mais covers na música pop gerou (punha todas as fichas na "Hallelujah" de Leonard Cohen, mas também está bom). Isto é efectivamente a banda sonora do filme homónimo, o sucessor do bem sucedido Hard Day's Night, lançado no ano anterior, e o registo inclui a canção que terá começado num sonho de Paul McCartney e terminado em Portugal, Albufeira, com a guitarra de Bruce Welch.



Mas Help! significa muito mais. É um álbum que vale por si, mas também é de transição para o que viria a ser o importantíssimo Rubber Soul. É o último a integrar várias covers, intervaladas entre originais de calibre, entre o rock dos primeiros anos e as novidades folk e o country - notória a influência de Dylan. Note-se a maior participação de George Harrison ("I Need You" e "You Like Me Too Much") e até a voz de Ringo ("Act Naturally"). Em 1965, Malcolm X é morto, a Guerra do Vietname faz meio caminho e os Beatles preparam-se para revolucionar a pop - outra vez.

sábado, 28 de maio de 2016

[Fundo de Catálogo] The Byrds - Mr. Tambourine Man (1965)


Provavelmente, este será o mais importante álbum de estreia de 1965. Está-lhe inerente a fundação do termo folk-rock, algo que, a grande inspiração deste disco, Dylan, viria a cimentar nos próximos anos, ao mesmo tempo que chocava os fãs de folk pura - Bringing It All Back Home, do mesmo ano, já tinha um pouco dessa polémica.

Os Byrds chegam a este som em que se destaca a 12-String Rickenbacker (muito celebrada nos anos 60) com um passado centrado na folk, sem rock. Os  próprios Byrds seriam fãs do Dylan dos primeiros discos, mas, ao contrário dos fãs mais rancorosos, seguiram a direcção do músico e poeta - esta veia poética, aliás, também surge representada Mr. Tambourine Man, com referências a Idris Davies e Dylan Thomas. São várias as canções escritas pela pena de Dylan e o mais celebrado original deste álbum, "I'll Feel a Lot Better", é admitidamente inspirada em "Needles and Pins" dos Searchers. Vale a pena mencionar também a clara influência dos Beatles e até arriscar umarriscado paralelo com as harmonias dos Beach Boys. 



Mas a mestria dos Byrds está em pegar no legado dos outros e criar o seu próprio som. Foi isso que fizeram: depois de influenciados, influenciaram multidões de bandas. 

quarta-feira, 18 de maio de 2016

[Fundo de Catálogo] Bob Dylan - Bringing it All Back Home (1965)


É o Dylan eléctrico, o Dylan traidor, o Dylan que cospe no legado da folk tradicional. Ou, pelo menos, era assim que os fãs dos primeiros quatro discos o viam. Bringing it All Back Home até é mais acústico do que eléctrico, mas os fãs não lhe perdoaram a ousadia. A electricidade é apenas um sinal. Dylan queria fazer diferente - não é por acaso que "Subterranean Homesick Blues" é muitas vezes apelidada de precursora do hip hop, não andará muito longe da verdade. Aquela que será, porventura, a mais celebrada canção deste registo terá sido inspirada em "Too Much Monkey Business", de Chuck Berry - é a música pop já a citar-se, logo no início.



O 5º disco de Dylan vem na sequência do encontro com os Beatles e da consequente "troca de influências" - também virá daqui a roupagem mais rock. Dylan terá introduzido os fab four à marijuana, qual convite à inspiração que também ia apanhando um imberbe Brian Wilson. As canções de protesto e sobre os direitos civis já não são novidade, mas aqui, Dylan está numa forma tremenda.  


E a capa, senhores? A capa (de Daniel Kramer) merece um parágrafo só para si, tal é a quantidade de elementos. Uma catrefada de vinis, eventualmente os que influenciaram este disco- ou não. São eles: Keep on Pushing (The Impressions), King of the Delta Blues Singers (Robert Johnson), India's Master Musician (Ravi Shankar),  Sings Berlin Theatre Songs by Kurt Weill (Lotte Lenya), The Folk Blues of Eric Von Schmidt (Eric Von Schmidt), Another Side of Bob Dylan (o próprio) e The Best of Lord Buckley (Lord Buckley). Há a Time de 1 de Janeiro de 65, com Presidente Lyndon B. Johnson na capa, uma harmónica na mesa, o gato (Rolling Stone) no colo do próprio Dylan e também lá está Sally Grossman, a mulher de Albert Grossman, o manager de Dylan. Os botões de punho terão sido oferecidos por Joan Baez - é a própria que o diz na canção de 75, "Diamonds & Rust". 

Seguia-se Blonde on Blonde.

domingo, 15 de maio de 2016

[Fundo de Catálogo] Beach Boys - Today! (1965)


Estes já são uns Beach Boys diferentes, em palco e em estúdio. Wilson a solo entre os botões, os restantes elementos a provocar a histeria nas digressões. Wilson, jovem de 22 anos, recém-vítima de um ataque de ansiedade que o introduziu à marijuana - método de prevenção de ataques de ansiedade, claro. O homem terá gostado tanto do efeito, principalmente ao nível da composição, que a continuou a usar para efeitos profissionais. 



Today! antecipa Pet Sounds.  um disco de transição, um álbum teste para aquilo que se seguiria, a mais reconhecida obra-prima dos Beach Boys, já longe do som surf e das letras dedicadas a jovens adolescentes. A ideia de álbum de transição é quase literal: a 1ª   metade é mais acelerada, com um som menos imaturo que o dos discos anteriores, mas ainda a estabelecer a ponte para as baladas mais adultas que compõem a 2ª parte do registo. São então uns Beach Boys mais sofisticados, com muito mais camadas de produção. Enfim, a sempre tão celebrada maturidade. 

quarta-feira, 11 de maio de 2016

[Fundo de Catálogo] John Coltrane - Love Supreme (1965)


A obra-prima de John Coltrane não é dele. É de Deus. Parece uma daquelas informações exageradas que tentam puxar pelo interesse do leitor, mas a frase, mais variação menos variação, é dele. Love Supreme (o próprio título refere-se a um amor maior, o de Deus) é descrito como a procura da purificação e o agradecimento por um talento que não é dele, mas do altíssimo. Faz então sentido dizer que este disco vinha a ser construído desde 57, altura em que Coltrane se começa a livrar-se do álcool e das drogas. Este é o testemunho dessa desintoxicação aliada a uma fé que só viria a crescer. Só viria a ser apresentado ao vivo uma única vez.



Love Supreme é também o último registo com o quarteto mais celebrado saxofonista: McCoy Tyner no piano, Jimmy Garrison no baixo e Elvin Jones na bateria. Muitas vezes destacado como o 2º mais importante disco de jazz de sempre, logo a seguir a "Kind of Blue" de Miles Davis, Love Supreme vendeu como disco pop e viria a influenciar gente como os U2 (amor declarado em "Angel of Harlem"), Patti Smith e Steve Reich.