sexta-feira, 1 de dezembro de 2017

[Fundo de Catálogo] The Grateful Dead - Anthem of the Sun (1968)


Tinha que ser completamente diferente da estreia homónima, disco que intervalava versões blues com canções de rnb com travo psicadélico. Mas não bastava ser diferente no estilo que agora passava a dar ares de rock progressivo. Também tinha que o ser na forma: a banda quer que o registo transponha as forças dos concertos para o estúdio. A vontade de complicar percebe-se só de olhar para um alinhamento pouco comum para uma altura em que apenas os discos jazz criavam álbuns de cinco canções, quatro das quais com mais de sete minutos. É o rock progressivo em tudo o que tem de polorizador: canções que eventualmente se arrastam e solos intermináveis. David Hassinger, o produtor do 1º álbum, por exemplo, perdeu a paciência. "Não sabiam o que queriam", concluiu.

terça-feira, 31 de outubro de 2017

Fundo de Catálogo] The Millenium - Begin (1968)




O melhor da história da pop é que teremos sempre um disco magnífico por desenterrar. Tal foi a atenção ao detalhe que Begin dos Millenium se tornou nentão chamada sco mais caro de sempre e um dos primeiros representantes da chamada sunshine pop. Em 68 não era raro complicar-se as coisas, mas o som ia no sentido do rock progressivo e não desta pop à Beach Boys. Desde Pet Sounds que não se ouvia nada assim. Aliás, desde sempre que não se ouvia nada assim. Basta ouvir "Prelude" e "5 a.m." com atenção. Imaginem Dylan a "rappar" "Subterranean Homesick Blues" ao ritmo destas baterias. Será isso hip hop?

sábado, 2 de setembro de 2017

[Fundo de Catálogo] The Band - Music From the Big Pink (1968)


Não tinham o nome nem o som mais original do mundo, mas Music From Big Pink "obrigou" Eric Clapton a colocar os Cream em suspenso e fez com que Roger Waters o classificasse como disco mais influente da história do rock logo atrás de Sgt Peppers. Numa altura em que o segredo psicadélico está já disseminado, a Banda vai no sentido inverso, o do regresso às raízes, decisão tomada após a queda de moto que encostaria Dylan entre julho de 1966 e dezembro de 1967. Tudo ou nada para os músicos de digressão do homem de "Like a Rolling Stone". Quase uma década de estrada e sombra, eis que os ex-Hawks saem da casca e enfiam-se na The Big Pink, casa rosa e edificada em Woodstock, cidade nova iorquina pródiga em mitologias rock 'n' roll. Na cave, com capa e uma ou outra letra de Dylan, quatro canadianos mais um criavam algumas das mais memoráveis canções norte-americanas de todos os tempos. Para trás fica a electricidade que ofereceram a Dylan. Ficam as harmonias folk, o country e o gospel.

quinta-feira, 10 de agosto de 2017

[Fundo de Catálogo] Silver Apples - Silver Apples (1968)


Se existe malta a quem o rótulo "experimental" parece assentar bem é a esta dos Silver Apples, eles que tão surpreendentemente regressaram em 2016, 20 anos, mais coisa menos coisa, depois de terem surpreendido com um outro regresso nos 90s. Mas não é só a forma como parecem brincar em estúdio numa pioneira tentativa de fazer música electrónica, é também a forma como o fazem, manipulando aquilo que a banda apelidou de "monte de lixo electrónico". Portanto, se vos perguntarem qual foi a 1ª banda de música electrónica na história, pelo sim pelo não, arrisquem nos Silver Apples. Uma resposta aprovada pelo enorme filão de bandas kraut que surgiriam na década seguinte.

quarta-feira, 9 de agosto de 2017

[Fundo de Catálogo] Os Mutantes - Os Mutantes (1968)


Tantas vezes apelidado de Sgt Peppers brasileiro, mas tão mais que isso. A estreia homónima de Os Mutantes tem o disco que mudou o mundo como referência máxima, sim, mas, às influências anglo-saxónicas (psicadelismo, doo-wop), adiciona-lhe a cultura local (bossa, samba) que resulta numa personalidade muito própria que mesmo que fosse cantado em inglês não deixaríamos de ter a certeza que seria brasileiro. Gil disse que era uma mistura de Pifanos de Caruaru e Sgt. Peppers. Sobre Panis et Circencis, a banda haveria de confessar a inspiração em "Penny Lane". O que Rita Lee, Arnaldo e Sérgio Dias, em colaboração com Veloso, Gil, Jorge Ben e Rogério Duprat (o George Martin da banda de São Paulo, diz-se) fizeram enquanto ajudavam a inventar o Tropicalismo em tempo de ditadura militar, é só um dos discos mais importantes de sempre e que terá sido mais eficaz que a canção de protesto. Se o tropicalismo pegava na literatura, cinema, música e artes plásticas para criar uma cultura de massas e questionar o que é ser brasileiro, o clássico d'Os Mutantes exporta essa definição. John Lennon e Kurt Cobain, por exemplo, gostaram.

terça-feira, 8 de agosto de 2017

[Fundo de Catálogo] Small Faces - Ogdens' Nut Gone Flake (1968)


1º disco a contar com uma capa circular e espécie de álbum conceptual sobre uma odisseia espacial? Original não era: Byrds e Pink Floyd já tinham explorado o tema com afinco ainda em 67. Mas reparem, os Small Faces levam-nos até à lua mais de 365 dias antes de Neil Armstrong. A história é a de Stan, ele que vai atrás da metade desaparecida de uma lua em quarto minguante, ponto de partida para uma viagem que é mais uma procura do sentido da vida. Na 2ª e menos interessante metade do álbum, a história é contada e não cantada. Melhor conservada pelo tempo está a 1ª metade, que é uma antítese da 2ª na forma como soa livre e muito menos baseada num guião. A banda considerou-o demasiado complexo para ser tocado ao vivo, a crítica classificou-o como resposta a Sgt Peppers, mas, numa espécie de maldição do ano 1968 e à imagem dos United States of America e dos Zombies, a banda viria a terminar pouco depois de concluir o álbum. Todos esses discos foram importantes, mas o dos Small Faces garantiu um surpreendente sucesso, muito graças a "Lazy Sunday".

segunda-feira, 31 de julho de 2017

[Fundo de Catálogo] The Zombies - Odessey and Oracle (1968)


Para além dos seus inúmeros predicados, Odessey and Oracle vem provar que nem só Sgt. Peppers servia de inspiração na temporada 1967/68. Os Zombies são muito mais Team Beach Boys do que Team Beatles, isto embora tenham gravado em Abbey Road e fossem conterrâneos dos Fab Four. As harmonias dos Beach Boys, a pop refinada de uns Kinks... o resultado só tem um erro e está no título que saiu Odessey em vez de Odyssey, fruto de eventual desmazelo devido à alegada liberdade que a concepção do disco gozou, sem pressões de êxito comercial. Separaram-se ainda antes da edição que, na altura passou despercebida, acabando o álbum por ser desenterrado. Porque com eles tudo aconteceu tarde. Até as digressões de promoção. 

terça-feira, 11 de julho de 2017

[Fundo de Catálogo] The Incredible String Band - The Hangman's Beautiful Daughter (1968)



Talvez não seja tão bizarro como esta música o foi em 1968, mas não deixa de ser singular que os ouvintes do 3º da Incredible String Band se dividam entre aqueles que na altura adoraram e depois deixaram de gostar, e os que alegam o caminho inverso, ou seja, a estranheza nos anos 60 e a luz anos depois. Não será de estranhar. Embora tenha sido uma pedrada no charco, a música dos Incredible String Band é de difícil audição, sendo que este "difícil" pode ser lido como "quase inaudível". Paralelamente, existe uma geração que bebeu tudo o que este The Hangman's Beautiful Daughter tem para dar. A geração de Devendra Banhart, de Joanna Newsom, a freak-folk que a Wire no arranque do milénio baptizou. 

É também um álbum frequentemente apontado como fundador daquilo a que hoje chamamos world music. Porque introduz elementos da Escócia Natal, das Bahamas, do Oriente e até do Norte de África, para além, claro, dos Estados Unidos. Na altura, os Led Zeppelin foram buscar inspiração e Paul McCartney rendeu-se (a surpresa será o elogio não ter vindo do mais viajado Harrison, mas siga). Um registo que não viaja apenas na música, mas também nas letras e que, ao contrário de Their Satanic Majesties Request não ficou lembrado pela inspiração de Sgt. Peppers na capa. 

sábado, 8 de julho de 2017

[Fundo de Catálogo] Mothers of Invention- We're Only in it for the Money (1968)


Ninguém estaria a salvo. Se em discos anteriores, os Mothers of Invention iam ralhando com assuntos como o Vietname, os direitos civis, o jornalismo e Elvis Presley, We're Only in it for the Money aumenta o raio de acção de Zappa: os hippies (principalmente os hippies), o psicadelismo, a política, os Beatles (basta olhar para a capa), Hendrix e até Donovan. O projecto é tão mordaz e pouco convencional que mesmo nos números em que há uma aproximação ao formato canção fica difícil levá-los a sério. 

terça-feira, 4 de julho de 2017

[Fundo de Catálogo] The United States of America - The United States of America (1968)


Quando os United States of America editam o álbum de estreia, 1968 já ia sendo marcado por um rock mais pesado e que caminhava para a criação de várias linhagens: o hardrock, o heavy metal, o rock progressivo, etc. Mas o que esta banda de um álbum só traz nem guitarras tem, embora existam teclados que não deixam sentir esse buraco. Joseph Byrd, cérebro disto tudo, era seguidor de John Cage, Stockhausen, La Monte Young e Steve Reich e dizia-se desconhecedor das raízes rock, algo que surpreende pela forma como este disco manifesta influências de Jefferson Airplane, Beatles, Velvet Underground e Nico e Mothers of Invention, por exemplo. Sabem aquelas bandas que soam descaradamente a outras bandas que já lá vão, mas referem nunca as ter ouvido? Deve ser verdade. Mas este não é um registo que se distinga pela sua acessibilidade, tal é a quantidade de motivos avant-garde que terá ido buscar aos já mencionados compositores. Importantíssimo para aquilo que viria a ser o krautrock.

quarta-feira, 28 de junho de 2017

[Fundo de Catálogo] Blood, Sweat & Tears - Child Is Father to the Man (1968)


A experimentação do pós-Sgt Peppers não se sugeria gratuita. Os Rascals, por exemplo, no seu 1º álbum sem o prefixo "Young" arriscaram técnicas de estúdio, mas o álbum caiu em saco roto por não revelar a inovação que outros tentavam trazer à equação. Não basta colocar sons de passarinhos e/ou outras trivialidades para soar fresco e fofo. É por isso que o registo de estreia dos Blood, Sweat & Tears é tão importante: traz o jazz, a música clássica e até a bossa nova para territórios rock. É rock sinfónico? Não é bem isso. Aliás, Child Is Father to the Man soa mais ao material que a Motown ou a Stax faziam sair das suas linhas de montagem. O homem que montou isto tudo, Al Kooper, terá bebido inspiração de um lustroso espectáculo jazz de Maynard Ferguson, em 1960, e lá enfiou uma secção de sopros num disco rock. Os pergaminhos já incluíam o trabalho enquanto teclista em "Like a Rolling Stone" e a actuação no Newport Folk Festival 1965. O líder da anterior banda blues, os The Blues Project, da qual pouco ou nada reza a história, terá recusado os tais sopros. 

terça-feira, 27 de junho de 2017

[Fundo de Catálogo] Velvet Underground - White Light White Heat (1968)


E num ano tudo muda. Despacharam Andy Warhol e Nico, mas deixaram ficar as guitarras abrasivas, a constante auto-sabotagem e as letras que variam entre sexo e drogas. Há aqui duas canções que poderiam estar em Velvet Underground & Nico, a faixa título e "Here She Comes Now", esta de longe a mais acessível do segundo dos Velvet. White Light / White Heat será a coisa pop mais inaudível criada até à data. Se já não eram muitos os fãs, imaginem quantos ficaram. "Ninguém o ouviu", chegou a dizer Lou Reed, não muito tempo antes de nos deixar. Não será assim tão verdade, mas se o Velvet & Nico é um fracasso que passou a um dos discos mais ouvidos de sempre, White Light... ficou mesmo meio esquecido.

sábado, 24 de junho de 2017

[Fundo de Catálogo] Steppenwolf - Steppenwolf (1968)


Tudo começou com Dylan e a electrificação no dia 25 de Julho de 1965, data do lendário concerto no Newport Folk Festival. É mais uma questão de atitude do que de aproximação aquilo que viria a ser cunhado de heavy metal. Hendrix, Cream, Blue Cheer, Spirit, entre outros mais ou menos obscuros foram calibrando e/ou sabotando a fórmula até este rock que nos habituámos a associar a concentrações motard, muito porque "Born to be Wild", o clássico deste registo de estreia dos Stepperwolf deu música à cena de abertura do clássico Easy Rider. Este álbum dos Stepperwolf, aliás, surge directamente associado ao cunhar do termo "heavy metal" devido a essa canção. A certa altura, John Kay canta "I like smoke and lightning / Heavy metal thunder...". Mas este som está longe de ser aquilo a que nos habituarmos a associar ao heavy metal. É blues e r&b bem electrificados. Rock 'n' roll, pronto. 

segunda-feira, 12 de junho de 2017

[Fundo de Catálogo] Spirit - Spirit (1968)


Hoje relativamente esquecidos, os Spirit alcançaram em 68 relativo sucesso comercial. Esta estreia homónima, à distância de quase 50 anos, podemos dizer, equilibra uma inspiração pelo passado (Doors, Pink Floyd, Hendrix, o vocalista Randy California teria tocado com este último) e o futuro (os Led Zeppelin viriam a semi-plagiar "Taurus" em "Starway to Heaven"). Na essência não é mais que outro disco psicadéllico com toques blues e jazz e pormenores orquestrais. Rock progressivo, vá. Terão influenciado gente tão nova como os Temples, por exemplo.

domingo, 11 de junho de 2017

[Fundo de Catálogo] Dr. John - Gris Gris (1968)


Apesar de gravado na Califórnia, o assombrado disco de estreia de Dr. John (ou The Night Tripper como é desde a primeira faixa introduzido) mantém o som de Nova Orleães, estado de onde provém Malcolm John "Mac" Rebennack, Jr. Gri-gris, termo de Nova Orleães para voodoo, é um registo que usa os blues e o jazz como pretexto para explorar caminhos psicadélicos,  mas afastados do som que chegava da paz e amor livre celebrados na Califórnia meses antes. A espiritualidade inerente ao título do disco não se fica por aí. Rebennack teria no seu manifesto de intenções uma música que combinasse sons de Nova Orleães, liderados por um músico imaginário chamado Dr. John, nome inspirado por Johhn Montaine, ditador africano por quem terá sentido uma espécie de parentesco espiritual. Mais uma fritaria, portanto. E, claro, não poderíamos deixar de mencionar o Mardi Gras, tradição local que se manifesta nos momentos mais dançáveis. 

segunda-feira, 5 de junho de 2017

[Fundo de Catálogo] Blue Cheer - Vincebus Eruptum (1968)


Não se percebe bem a intenção de um disco como o de estreia dos Blue Cheer. Percebe-se que vai beber à revolução rock que Hendrix tinha encetado oito meses antes, percebe-se que há uma vontade de pisar terrenos imberbes como o metal ou o stoner, embora na altura os termos ainda não existissem. Não se percebe é o facto de Vincebus Eruptum gozar de uma produção tão inexistente, motivo suficiente para ainda hoje se dizer que também é percursor do noise. É um disco estranho, de solos esquisitos e riffs qb, mais celebrado pela importância do que pela qualidade. Reparem: "Helter Skelter" ainda estava lá longe e a versão de "Summertime Blues" já se fazia ouvir bem mais alto que o clássico dos Beatles. 

domingo, 4 de junho de 2017

[Fundo de Catálogo] The Byrds - The Notorious Byrd Brothers(1968)


É um milagre que isto tenha corrido tão bem, tal foi a confusão que rodeou as gravações de. The Notorious Byrd Brothers, álbum que deixou os Byrds reduzidos a metade: Roger McGuinn e Chris Hillman. No alinhamento dos dois últimos discos estavam também David Crosby e Michael Clarke que chegaram a contribuir, mas acabaram despedidos (o primeiro) ou a despedir-se (o último).

Se em 1962 Ray Charles inaugurou uma fresca mistura country e gospel, mais de cinco anos depois, os Byrds apresentam o country ao rock de ares psicadélicos. Há uma canção que sintetiza bem o registo: "Old John Robertson", cantiga country, com vários truques de estúdio e toques psicadélicos. A veia country haveria de tomar ainda conta deste som, mas já lá vamos.

sexta-feira, 17 de março de 2017

[Fundo de Catálogo] The Beatles - Magical Mistery Tour (1967)


A diferença que faziam quatro/cinco meses nos anos 60... a partir do 1º de Junho, SgtPeppers transformava-se na banda sonora do Summer of Love. Em Novembro/Dezembro, Magical Mistery Tour é a banda sonora do 3º filme protagonizado pelos Beatles e o Verão do Amor está enterrado, já depois (claro) de "All You Need is Love" juntar-se a "San Francisco (Be Sure toWear Some Flowers in Your Hair)" como hino hippie. A canção dos Beatles fez parte da primeira transmissão satélite, em que 25 países partilharam algo entre si. Os Beatles projectaram a sua mensagem de paz, numa composição que só podia ser de Lennon. Antes, em 64 e 65, os Fab Four já tinham lançado A Hard Day's Night e Help!, respectivamente, mas Magical Mistery Tour era diferente e a crítica estranhou. Embora, com o tempo, a experiência tenha vindo a entranhar pela sua liberdade, em 1967 foi um fracasso.



Nesse tal verão hippie, os Beatles recusavam-se a entrar em digressão e tinham perdido Brian Epstein, manager de sempre. Em tempo de edições diferentes para diferentes mercados, para os britânicos, Magical Mistery Tour foi um EP, para os americanos um LP. Com o tempo, o registo ganhou estatuto suficiente para ser considerado no catálogo principal da banda. Convenhamos, eram os Beatles e os Beatles em 1967 eram diferentes e estavam a um nível em que quase tudo o que criavam era magnífico e simbolizavam um passo em frente para a história da pop. Muitas destas canções vêm na sequência das gravações de Sgt. Peppers e é um registo de continuidade em que McCartney continua a dominar a composição, Lennon protagoniza o melhor material e George Harrison pica o ponto com a qualidade, subvalorização mediática e motivos orientais do costume.


Mesmo sendo um dos discos menos celebrados da discografia dos Beatles, é um dos mais analisados, seja pelas referências a drogas, teorias da conspiração e referências à infância da dupla Lennon/McCartney. Os locais da cidade citados são tantos que há tours temáticas.

sábado, 4 de março de 2017

[Fundo de Catálogo] Leonard Cohen - Songs of Leonard Cohen (1967)


E no mesmo dia, 27 de Dezembro de 1967, Bob Dylan e Leonard Cohen editaram discos tremendamente influenciados pela Bíblia. E, embora Dylan fosse substancialmente mais novo, já levava quase uma década disto. Cohen era a primeira vez que materializava os seus poemas e escritos em algo musical. Já tinha 33 anos quando este Songs of Leonard Cohen se mostrou diferente de tudo o que ouvíramos até aí, incluindo a discografia de Robert Allen Zimmerman.

O poeta e escritor vira então um dos mais influentes músicos de todos os tempos. Ainda não domina a melodia, mas saca algumas das suas canções mais emblemática, muito pela força e complexidade literária que coloca na estreia. Esta complexidade demorou meses a criar, algo fora do comum nos anos 60 em que seis meses davam para editar dois discos do mesmo artista e não, como no caso de Cohen, para compor e gravar um único registo. Embora sem grandes melodias, o som folky vive à base do fingerpicking à John Fahey e da inclusão de outros ocasionais instrumentos que não deixam cair estas dez canções no bocejo.

Noutra curiosidade e comparação entre os grandes poetas musicais do século XX, o título de uma canção de  Dylan deu nome aos Judas Priest e o nome de uma canção de Cohen baptizou os Sisters of Mercy.

[Fundo de Catálogo] Bob Dylan - John Wesley Harding (1967)



E, de fininho, Dylan regressa do meio da azáfama psicadélica e toca como se nada fosse. Deixou de influenciar e deixar influenciar pelos Beatles e, tal como os Beach Boys, recua. Regressa a um som acústico. A voz de uma geração deixa-o de ser porque, entretanto, a voz é vítima de uma acidente de mota e a geração vira hippie.  

Depois da recuperação do acidente, de um período em que gravou The Complete Basement Tapes e de muito estudar a Bíblia, Dylan regressa com vontade de manter discreto e chega mesmo a rejeitar a edição de singles. Ainda para mais, John Wesley Harding chega depois do Natal, mesmo a fechar o ano. Se até aí é a canção de intervenção que o guia, aqui, no ao 8º disco, é a Bíblia que lhe orienta a inspiração. 

Diz-nos o livro 61 Highways Revisited que são 60 as referências bíblicas aqui embutidas. De Provérbios ("The Wicked Messenger") a Apocalipse ("All Along the Watchtower"), passando por Isaías ("All Along the Watchtower" novamente) e Samuel ("The Wicked Messenger novamente), por exemplo. Estas são referências directas, mas há mais. Há "I Dreamed I Saw St. Augustine" e a depravação e o arrependimento, e há "Drifter's Escape" que arranca com um "Oh, help me in my weakness" e termina com o milagre: "Just then a bolt of lightning Struck the courthouse out of shape / And while ev’rybody knelt to pray / The drifter did escape". Ou ainda "I Pity the poor immigrant" que parece ser uma canção sobre descrentes: "That man whom with his fingers cheats / And who lies with every breath / And likewise, fears his death".

Apenas um paralelismo com as gentes do psicadelismo: num ano em que várias capas que pareciam uma derivação de Where's Waldo, também Dylan quis passar despercebido.

sexta-feira, 3 de março de 2017

[Fundo de Catálogo] The Who - The Who Sell Out (1967)


No dia 14 de agosto de 1967, as transmissões de rádio em águas territoriais do Reino Unido passam a não ser permitidas, aniquilando as rádios pirata que aí se refugiavam para oferecer o rock que fugia da programação das BBCs. Dois meses antes, os Who deixam rasto no Monterey Pop Festival e três meses depois, a banda que, apesar do clássico "My Generation", ainda não tinha editado um grande disco, decide lançar um registo conceptual que simulasse a transmissão de uma rádio pirata, com jingles e anúncios inventados. A ironia inerente ao título estende-se à capa e a algumas das canções do disco, em que promovem desodorizantes, Heinz Baked Beans, tatuagens e pomadas para combater o acne. Para além de algumas referências sexuais que são caras aos miúdos, claro, ou não fosse esse o público das rádios pirata.

A primeira metade de The Who Sell Out deixa o espalhafato dos discos anteriores para se envolver no psicadelismo mais debochado e excessivo, à Beatles de Sgt Peppers ou Zappa nos Mothers of Invention ou mesmo dos Stones que tinham acabado de editar Their Satanic Majesties Request. Só Brian Wilson se parecia levar a sério. Na segunda metade, "I Can See for Miles" é tão a sério que, para além de ser tida (de forma ousada, diga-se) como um dos primeiros exemplos de rock progressivo, terá inspirado Paul McCartney a criar "Helter Skelter", para muitos a primeira canção com laivos metal de sempre. A história:o Beatle estaria a ler uma review a The Who Sell Out e deparou-se com uma frase que descrevia "I Can See for Miles" como a "canção mais pesada de sempre". McCartney, claro, teve que se superlativar. Talvez seja então a segunda parte do álbum, sem referência radiofónicas, que, no meio de tanta paródia, tenha acabado por ser levado a sério. É de valor.

terça-feira, 28 de fevereiro de 2017

[Fundo de Catálogo] The Rolling Stones - Their Satanic Majesties Request (1967)


O caos seria tal que, segundo Brian Jones, a um mês da edição deste Their Satanic Majesties Request, a banda ainda não teria nada. Keith Ricards haveria de trata-lo por “lixo” e Mick Jagger assumiria: "não é grande coisa". A verdade é que o disco que em tempos foi resignado a medíocre resposta a Sgt. Peppers Lonely Hearts Club Band dos Beatles, acabou por envelhecer bem. “2000 Man”, por exemplo, tem algo de profético adivinhando de certa forma o boom tecnológico do século XXI. Isto numa altura em que os computadores ainda nem era acessório caseiro.  


A drogaria seria tal que a primeira proposta de capa para o disco foi colocar Jagger numa cruz. A editora, claro, chumbou a ideia, mas não evitou que Andrew Loog Oldham abandonasse o estúdio, deixando os Stones à mercê das doses de LSD. Cada elemento do grupo trazia várias outras pessoas para estúdio numa desorientação total a que a produção descuidada faz jus. 

Nessa altura, a banda já tinha inventado um dos riffs mais influentes de todos os tempos que, por sua vez, já tinha influenciado uma data de outros. Their Satanic Majesties Request é o disco mais diferente dos Stones e por isso o mais fácil para um não fã da banda gostar. Estranho que tenha sido tão comparado com Sgt. Peppers quando é, se assim se pode dizer, um disco bem  mais psicadélico. O oitavo dos Beatles explora bem mais a canção pop do que o anterior Revolver, esse sim, o hino psicadélico da banda.

Picaram o ponto psicadélico e, depois disto, voltariam à base: os blues.

sexta-feira, 24 de fevereiro de 2017

[Fundo de Catálogo] The Jimi Hendrix Experience - Axis: Bold as Love (1967)


Como suceder um disco de estreia que foi uma verdadeira pedrada no charco e que inventou uma nova forma de tocar e explorar a guitarra? Editar no mesmo ano, sete meses depois, e elevar a fasquia com canções mais desafiantes e um disco mais dado à experimentação. Basta ouvir a faixa de abertura, "EXP", que não chega a ser uma canção mas quase dois minutos de uma entrevista que é abafada pelo feedback da guitarra de Hendrix e acaba por se transformar em "Up the Skies"; uma canção sobre aliens. 

Injusta e tantas vezes visto de forma demasiado simplória como o patinho feio da discografia, Jimi, Noel Redding e Mitch Mitchell não mudam demasiado a fórmula, apenas fazem por passeá-la por novos trilhos. Assim, o power trio volta a pisar terrenos blues, jazz, psicadelismo e soul enquanto começavam-se a gastar os melhores riffs da história do rock. E os próximos anos só piorariam a situação, muito graças ao próprio Hendrix e outro "Jimi", Jimmy Page. 

[Fundo de Catálogo] Love - Forever Changes (1967)

Se Da Capo os inclui no catálogo psicadélico, Forever Changes afasta-os para algo completamente novo em 1967: um registo folk-rock latino-americano. Culpa dos trompetes e do som tipo Herb Alpert & the Tijuana Brass, grupo que nesse mesmo ano lançara Sounds Like... um dos best sellers do ano. Nas referências mais óbvias, os Love iam a Bob Dylan e, como todos os outros, aos Beatles (era Rubber Soul/Revolver). 

Ironicamente, ao contrário do tal disco dos Tijuana Brass, Forever Changes não vendeu quase nada. Os Love colocavam-se do lado dos Doors, companheiros editoriais, e partilhavam o mesmo cinismo perante uma onda de positivismo contrastante com as guerras americanas, internas e externas. Não custa muito acreditar que para um afro-americano como Arthur Lee (cérebro de quase tudo o que está aqui) a luta pelos direitos civis lhe fosse cara. No documentário Love Story disse que um amigo o havia aconselhado a não tocar em assuntos como a política e a religião. "Ele estava enganado",  concluiu. 

Nas palavras do próprio, Lee terá pressentido que não passaria do Verão de 67 e criou um testamento, algo que espelhasse o que sentia, daí que o resultado seja tão pessimista e propositadamente afastado dos ideias do Summer of Love que entretanto já era história. Mas este é também um disco sobre o deteriorar da relação entre Lee e o outro ego do grupo: Bryan MacLean, filho de um arquitecto de Hollywood, o burguês da banda. Seria a última vez que a formação original gravaria junta. Na rodapé das curiosidades, destaque para Neil Young que era suposto produzir, mas, à última hora, decidiu avançar com a sua carreira a solo, embora, nem dois anos depois, tenhamos percebido que não era bem assim. 

Forever Changes é uma espécie de Velvet Underground & Nico na forma como influenciou tantos e passou despercebido no seu tempo. 


terça-feira, 21 de fevereiro de 2017

[Fundo de Catálogo] Jefferson Airplane - After Bathing at Baxters (1967)


Interessante perceber que depois do enterro do Summer of Love, também os Jefferson Airplane decidiram seguir outro caminho. Depois de um muito bem sucedido Surrealistic Pillow, álbum que ofereceu dois hinos, "Somebody to Love" e "White Rabbit", o grupo avança para a auto-sabotagem, à imagem do que os Velvet Underground fariam mais adiante: um registo sem singles óbvios, propositadamente arriscado e disruptivo. Frank Zappa passa a ser o farol da mais celebrada banda de São Francisco, o psicadelismo passa a andar de mãos dadas com o caos de mais uma viagem sem destino premeditado. Conceptual e dividido em cinco fases (Streetmasse, The War is  over, Hymn to an Older Generation, How Suite It Is e Shizoforest Love Suite) é o segundo disco em apenas um ano e a prova provada que 1967 é um dos anos mais rápidos da história da pop. Segue jogo, já íamos no final de Novembro e ainda faltavam discos importantíssimos dos Love e Rolling Stones.

[Fundo de Catálogo] Cream - Disreli Gears (1967)


O primeiro power trio e super grupo da história estava de volta, quase um ano depois. Só para termos uma noção da velocidade a que tudo acontecia, entre os dois registos, o Summer of Love começou e terminou, os Doors lançaram dois álbuns e inauguram um lado negro que abana o status quo editorial, os Beatles mudam o mundo e nasceu o rock progressivo

A fórmula não é muito diferente, mas enquanto a base continua a ser o blues que agora também é jazz, mas as letras e a voz de Jack Bruce viram-se para o psicadelismo. Inspirados pela estreia de Hendrix, o trabalho de Clapton na guitarra também complexifica-se, com mais pedais e riffs elaborados. O mais incrível é que não há momentos que os egos lutem de forma óbvia, nem há virtuosismo pelo virtuosismo. Era aproveitar enquanto os melhores músicos dos anos 60 ainda se entendiam. Nos anos 70 seguiriam caminhos diferentes.

segunda-feira, 20 de fevereiro de 2017

[Fundo de Catálogo] Moody Blues - Days of Future Passed (1967)


A ideia seria gravar uma versão rock em stereo da 9ª sinfonia de Dvorak, a New World Symphony. O resultado é o primeiro álbum de rock progressivo, antes mesmo do termo e dos King Crimson existirem. Em 1967, a metamorfose era uma prática bastante comum: bandas que viravam do rock para o psicadelismo, artistas folk que de cantores de protesto passavam a compositores barrocos, grupos que trocavam o palco pelo estúdio. A transformação dos Moody Blues. ex-grupo r&b, só por si, não é surpreendente, mas aquilo em que se transformou é o que torna este Days of Future Passed um dos mais influentes discos de sempre a derivarem de um dos discos mais influentes de sempre: Sgt Peppers, claro. 

Já tínhamos laivos de conceito anexados a álbuns, como Pet Sounds, Face to Face, Freak Out! ou, claro, Sgt Peppers, mas este deverá ser mesmo o primeiro álbum a criar um conceito e a navegar à volta do mesmo: o conceito de dia (referência aos Beatles?), com o arranque madrugador e fim nocturnal. Pelo meio, a London Festival Orchestra funde-se com os músicos num som sinfónico, psicadélico, fresco. Não é bem o fogo dos Beatles, é até contido, poético, acolhedor.

sábado, 18 de fevereiro de 2017

[Disco] Austra - Future Politics


É simbólico que Future Politics tenha sido editado no tão badalado Inauguration Day, o dia 1 de Donald J. Trump enquanto twitteiro que também é Presidente dos Estados Unidos da América. 20 de Janeiro passou também a ser o dia 1 da cultura vs Trump. É possível que nos próximos meses e anos, o ritmo aumente, mesmo que, como disse recentemente um escritor algures, os americanos apenas tomem atenção ao que se passa em Hollywood. 



Aparentemente, Future Politics foi escrito antes da eleição mais estapafúrdia da história, mas a viragem para uma cultura xenófoba, racista, intolerante e de extrema direita já está em marcha faz anos. É um álbum conceptual que tem sido descrito como distópico. Mas andaremos assim tão longe disto? Não, o que se ouve aqui são relatos bastante actuais sobre o mundo tecnológico, cidades descaracterizadas, religião e outros temas fracturantes da sociedade de hoje, de Trump ao Airbnb. Podem-se estabelecer paralelismos entre este disco de Austra e a mensagens dos Knife, embora aqui tudo seja bem menos abstracto.

[Fundo de Catálogo] Phil Ochs - Pleasures of the Harbor (1967)


E mais um disco incrivelmente influenciado por Sgt Peppers..., mas Pleasures of the Harbor não se fica por aqui e deixa entrar os temas fracturantes da altura, o Summer of Love, a Guerra do Vietname, a morte de JFK, a luta pelos direitos civis e a revolução cultural chinesa. Phil Ochs chega a 1967 já com uma carreira folk como cantor de protesto, depois de ter estudado jornalismo, altura em que ganhou o interesse por política. Mesmo aqui, altura em que deixa a folk para trás na procura de coisas maiores, o protesto continua a ser preponderante.

Em 1962, Ochs muda-se para Nova Iorque e ambiciona ser o melhor cantor folk que existe. Depois conhece Dylan e rectifica: "vou ser o segundo melhor cantor folk que existe". Testemunhos referem que, embora existam trocas de elogios documentadas, Dylan conseguiu ser um verdadeiro idiota para Ochs. Em 1967, Ochs muda-se para Los Angeles e a folk vai perdendo força para a frente psicadélica e Phil Ochs deixa-se influenciar pelos Beatles e Beach Boys, algo que acaba por manifestar-se no seu mais ambicioso registo até à data.

Letras poéticas, políticas, caricaturadas e pormenorizadas, produção barroca e ambiciosa. Phil Ochs não concebia a ideia de que o álbum poderia correr mal. Mas correu: críticas negativas e as vendas relativamente fracas levaram-no ao progressivo declínio que levaria ao dramático suicídio. Ochs sempre quis a consagração que nunca chegou em tempo útil. Ainda vamos a tempo de redescobri-lo e este Pleasures of the Harbor é fundamental se um dia o quisermos repescar a sério. É o Newport Folk Festival de Ochs, na medida em que deixa as canções folk de protesto para se transfigurar e mudar radicalmente de direcção. É cínico, é absurdo ("The War It's Over" chegou a provocar motins) e enigmático. Sobre "Cruxifixion", eventualmente a faixa mais polémica do disco, haveria de dizer: "é sobre a morte de Cristo, sobre a forma como toda a América e especialmente Nova Iorque adoram criar heróis para lhes dar lições de moral e depois assassiná-los violentamente. É uma canção sobre Kennedy. E talvez seja uma canção sobre Dylan". Viveria mais nove anos, mas o melhor Phil Ochs terminava aqui.

quarta-feira, 15 de fevereiro de 2017

[Fundo de Catálogo] Captain Beefheart and his Magic Band - Safe as Milk (1967)


Foi desde pequeno que Beefheart captou a atenção da família e o encorajamento necessário para desenvolver os seus talentos. É também em miúdo que conhece Frank Zappa que haveria de se tornar a sua grande influência, sendo que aqui neste Safe as Milk essa influência manifesta-se na forma como parodiou tudo o que o rodeava.

Há algum tempo que Beefheart gravava covers r&b para a A&M, a editora habitual que acabou por chumbá-lo desta vez. Uns disseram que as canções eram demasiado depressivas, outros eram mais específicos, como Jerry Moss, executivo da editora terá referido que o conteúdo de "Electricity", por exemplo, seria demasiado sugestiva para os ouvidos da sua filha. Tivesse-lhe mostrado "I'm Glad", eventual paródia a uma canção dos Miracles, e pode ser que...

O disco, fortemente influenciado pelos blues, mas também pela soul, influências western e outras de Phil Spector aqui e Kinks ali, acabou por ser editado pela Buddah Records e, alegadamente, adorado por John Lennon. Pode Safe as Milk ser levado demasiado a sério? Claro que não, mas reconhecemos aqui algum material que haveria de influenciar gente menos óbvia, como John Frusciante, e outra mais evidente como Mike Patton.

 

terça-feira, 14 de fevereiro de 2017

[Fundo de Catálogo] Procol Harum - Procol Harum (1967)


Depois de Sgt Peppers, as coisas já não mudam apenas a ritmo mensal, mas sim semanal. Enquanto uns pegavam nas influências e tentavam quebrar barreiras, levando as coisas ainda mais além, outros fracassam e deixam-se consumir pela frustração. Outros ainda nem uma coisa nem outra, apenas boas canções, ali entre os Cream e Bob Dylan, como é o caso dos Procol Harum, eles que já tinham o clássico "A Whiter Shade of Pale" editado seis meses antes e, mesmo com o sucesso de vendas, não o repescaram para a edição britânica do álbum de estreia. Nos Estados Unidos, a história haveria de ser outra. 

No meio de tanta revolução, o primeiro dos Procol Harum acaba por ser um disco fantasma, passando ao lado de muitos revisionismos históricos. O envelhecimento do registo, aliás, está cheio de episódios bizarros: "Conquistador" só seria sucesso em 1972, quando abriu o disco ao vivo Procol Harum Live: In Concert with the Edmonton Symphony Orchestra; Em 2005, Matthew Fisher, que escreveu "Repent Walpurgis", lança um processo alegando ter contribuído na composição de "A Whiter Shade of Pale", acabando por ganhar e garantir parte dos royalties, o que dá um "jeitão" quando já se está a gozar a reforma.

Apesar de ter sido gravado em multitrack, Procol Harum acabou por ser editado em mono e as gravações originais em stereo terão desaparecido para sempre. Talvez tivesse sido essa a sua revolução. Uma falhada.

segunda-feira, 13 de fevereiro de 2017

[Fundo de Catálogo] The Doors - Strange Days (1967)


Os Doors pela segunda vez em menos do ano, nada surpreendente no ritmo editorial dos sessentas, embora muito deste material venha na sequência de canções já pensadas no tempo pré-álbum de estreia. Quer isto dizer que Strange Days segue a linha sonora de The Doors, mas permite à banda investir mais tempo na exploração de estúdio. Também eles eram inspirados por Sgt. Peppers. Quem não? 

Nota-se que Morrison permite-se explorar ainda mais fundo a sua veia poética. Há. aliás, uma faixa simbólica no reforço dessa ideia: "Horse Latitudes", 95 segundos em registo spoken word. Não é tão conturbado como a estreia, não é um terramoto que foi aquele disco editado no arranque de 1967, não tem faixas censuradas e não tem nenhuma "Light My Fire", embora a complexidade lírica de "When the Music is Over" rivalize de certa forma com a faixa matriz de The Doors. Os Doors eram anti-establishment, estavam nos antípodas do Summer of Love. A filosofia, o misticismo e a arte guiavam um deprimido e negro Jim Morrison. O resultado soava invariavelmente escuro. 

The Doors vendeu mais de 7 milhões de cópias, Strange Days não chegou aos 2 milhões de exemplares. Os hippies tinham os dias contados. Estava tudo de regresso ao normal.

domingo, 12 de fevereiro de 2017

[Fundo de Catálogo] Beach Boys - Smiley Smile (1967)


Brian Wilson prometeu: "será melhor que Pet Sounds". Não contava com uma das mais celebres aplicações da Lei de Murphy da história da industria discográfica. Smiley Smile nunca esteve para acontecer. Smile era a ideia original (felizmente, tivemos oportunidade de viver para ver um esboço daquilo que poderia ter sido e, se fosse assim seria incrível) e acabou por render uma das mais incríveis histórias do catálogo pop. 

Depois de  Pet Sounds, Wilson preparou outra bomba: "Good Vibrations", single que seria ponto de partida para o tal disco maior que Pet Sounds, maior que Sgt. Peppers, maior que a vida. As frustrações de estúdio, os problemas de saúde do cérebro dos Beach Boys e o desentendimento com os companheiros que se desentendiam com Van Dyke Parks (braço direito de Wilson) porque, alegadamente, escrevia letras demasiado difíceis de apanhar sabotaram-no. Sgt Peppers foi a estucada final. 

Mas embora soe de facto inacabado, Smiley Smile foi crescendo com o passar dos anos. Não fosse a confirmação depois cancelada à última da hora no Monterey Pop Festival e diríamos que estavam completamente alheados do Summer of Love. É diferente de tudo o que se passava em 1967, eventualmente com excepção em Frank Zappa: pega em influências avant-garde e antecipa a música ambiental. A produção lo-fi de boa parte das mais despidas canções contrastam com outras duas que parece a mais: uma é "Good Vibrations" que Wilson insistiu para que não fosse incluída, a outra é "Heroes and Villains". Fragmentado, sim, mas visionário. O homem tinha mesmo qualquer coisa e não apenas problemas mentais provocados por drogas e/ou frustrações. Smiley Smile é um dos acidentes mais influentes da história. E ainda que inacabado faz inveja a tanta discografia. 

sábado, 11 de fevereiro de 2017

[Fundo de Catálogo] The Kinks - Something Else by the Kinks (1967)


O anterior Face to Face, embora celebrado enquanto eventual primeiro disco conceptual da história, já tinha aquela perfeição em que não conseguimos apontar canções a mais. Something Else segue a mesma linha e mostra-nos os Kinks enquanto magnífico aglutinadores de tudo o que passava na música pop em 1967: a bossa de "No Return", o psicadelismo beatlesco de "Lazy Old Sun", aquela intro de "Death of a Clown" que eventualmente traz-nos a intro de "You Still Believe In Me" à cabeça e a soul de "Tin Soldier Man". Íamos a meio da tão afamada golden age dos Kinks. 

sexta-feira, 10 de fevereiro de 2017

[Fundo de Catálogo] Tim Buckley - Goodbye and Hello (1967)


Regressamos a Goodbye and Hello e apercebemo-nos da impressionante quantidade de afirmações do género "o filho é melhor que o pai" e vice-versa, com argumentos que fazem lembrar aquelas discussões que temos no tempo do básico sobre jogadores da bola e que acabam, invariavelmente, num "são jogadores diferentes, não dá para comparar", e acabou a conversa. Ambos tinham dom vocal, ambos morreram cedo e ambos deixaram um legado incontornável. A partir daí, qualquer termo de comparação torna-se discutível. 

Goodbye and Hello surge depois de Buckley deixar escolha, mulher e bandas para trás e depois também da edição de Sgt Peppers Lonely Hearts Club Band, álbum que sai no dia 1 de Junho de 1967 para contaminar todo o segundo semestre. A folk de Buckley passa a incluir, em alguns casos, nomeadamente nas duas primeiras canções, sons que contextualizam o tema das canções que são sobre guerra, drogas e solidão na sua maioria, todas poéticas, mas com um nível de risco e exploração quem nem Donovan, nem Dylan, ele que estava a recuperar de um acidente de mota e não daria notícias durante o que restou do ano civil, teriam alcançado na altura. Ouvimos fantasmas muito ocasionais de John Fahey e notamos a preciosa ajuda de Larry Beckett, aspirante a poeta e escritor de canções que mais recentemente se tornou num crítico literário, ele que colaborou em seis canções, deixando a sua marca nalgum do melhor material de Tim Buckley. 

quarta-feira, 8 de fevereiro de 2017

[Fundo de Catálogo] Pink Floyd - The Piper at the Gates of Dawn (1967)



Não há nenhum outro disco dos Pink Floyd como The Piper at the Gates of Dawn porque não existem mais álbuns dos Pink Floyd com Syd Barrett sóbrio e ao leme. A estreia dos britânicos é um reflexo da mente de Barrett, seja do título, "roubado" a um livro infantil às letras que, ou são sobre o seu gato ("Lucifer Cat") ou são inspiradas noutros livros infantis.

Tal como com vários outros registos psicadélicos, há quem acredite que este é que é o álbum que sintetiza o movimento. Já o dissemos antes: o psicadelismo não terá uma obra que o defina, mas sim um conjunto. Estes Pink Floyd aproximavam-se mais da cena mais negra dos Doors do que das bandas californianas mais ligadas ao Summer of Love. 

As letras e constantes referências espaciais acabaram por conceder a The Piper... o rótulo de primeiro registo space rock da história. A banda fundia essas notas futuristas (o homem ainda nem tinha ido à lua) com referências psicadélicas, embora tenham chegado a dizer que não faziam ideia no que consistia o psicadelismo. Claro que sabiam: Barrett mantinha uma relação demasiado próxima com LSD e os Pink Floyd acabariam por visitar as gravações de Sgt. Pepper's Lonely Hearts Club Band, o clássico (quase literalmente) da porta do lado, ali nos mesmos estúdios Abbey Road. Haveriam, aliás, de se deixar influenciar por "Lovely Rita", trazendo sons de animais e outros efeitos vocais que preenchem o disco todo. Mas, como disse e muito bem Joshua Klein, da Pitchfork, por altura do 40º aniversário do disco, "os resultados não poderiam ter sido mais diferentes, com os Beatles a controlares o estudo e os Pink Floyd a usarem-no para perder controlo". Um caos talvez inspirado na loucura dos Mothers of Invention.

Há mais: há referências bíblicas, "Take Up Thy Stethoscope and Walk", eventual alusão a João 5:8., a dicotomia entre "Astronomy Domine", sendo que "Domine" é o latim para “Deus”, e a faixa que se segue, “Lucifer Sam". E, claro, "Interstellar Overdrive" que acaba por conceder pistas em relação ao futuro que haveria de ser o dos Pink Floy sem Syd Barrett. 

É um registo tão importante que há melómanos que são apenas fãs deste disco dos Floyd. Fãs tão ilustres como este, por exemplo.


domingo, 5 de fevereiro de 2017

[Fundo de Catálogo] Bee Gees - Bee Gees' 1st (1967)


Vamos tentar fazer uma única referência ao disco sound neste texto e, pronto, está feito. Em 1967, os Bee Gees já tinham dois discos gravados na Austrália, mas nem por isso que este Bee Gees' 1st deixa de ser vendido como álbum de estreia noutros mercados. A que soavam os Bee Gees se o disco sound (ups!) só aparece uma década depois? Tentavam soar aos Beatles, mas rodeados de cordas (aquilo a que se convencionou dar o nome de barroco) e harmonias. "In My Own Town" podia estar em Rubber Soul, várias outras poderiam estar em Revolver. Aliás, terão existido rumores que apontavam no sentido de a banda de Manchester serem os Beatles disfarçados. Senão, acompanhem-nos nesta teoria: "Bee Gees", "BGs", "Beatles Group", isso.

Nota ainda para umas poucas notas futuristas, isto na altura em que se faziam discos inspirados em Star Trek e os Byrds já tinham editado 5th Dimension há mais de um ano. E, por fim, se os Hollies ficaram com a distinção da 1ª capa descaradamente psicadélica, os Bee Gees ficaram com a 2ª. Um mês de diferença, nem isso, mas uma eternidade na 2ª metade da década de 60.

[Fundo de Catálogo] The Beatles - Sgt. Pepper's Lonely Hearts Club Band (1967)


Depois de Rubber Soul, disco perfeito e sem canções para encher (Brian Wilson dixit), de Revolver, iniciação ao psicadelismo num disco livre e o último que terá contado com um grupo unido na sua composição. Sobre as gravações de  Sgt Peppers..., Ringo haveria de dizer mais tarde que só se lembra de aprender a jogar xadrez e George Harrison confessar-se-ia irritado e longe do resto do grupo. Nas palavras do próprio: "era Lennon a criar ao piano e o Ringo a manter o tempo". Brian Wilson, homem cuja visão, frustração e perfeccionismo ia puxando a pop para lá dos limites que eram derrubados todas as semanas (pelos Doors, pelos Jefferson Airplane, pelos Velvet Underground, por Jimi Hendrix, só para nos ficarmos nos seis primeiros meses de 67), haveria de atirar a toalha ao chão. Os Beatles passavam a jogar num campeonato só seu.

1 de Junho de 1967, o mesmo dia da edição da esquecida e esquecível estreia de David Bowie, três dias depois do incidente no Tompkins Square Park, no Memorial Day, o início do fim do Summer of Love. Sgt Peppers Lonely Hearts club band tornou-se a banda sonora dessa geração a par, claro, de “SanFrancisco (Be Sure to Wear Flowers in Your Hair)”, escrita e interpretada por membros dos The Mamas & The Papas, sempre excelentes na descrição de banalidades, seja o movimento hippie, seja uma segunda-feira. E só não conseguimos referir que a relação foi reciproca porque o registo terá sido gravado ao longo de quatro meses, uma eternidade para a altura. Sim, numa altura em que já tinha abandonado de vez os palcos, e de forma irónica, os Beatles terão passado o movimento todo em estúdio.

O objetivo seria uma obra conceptual sobre uma banda ficcional, a que dá título ao disco e que vai sendo introduzida canção a canção. Rapidamente aborreceram-se e fica apenas a introdução da faixa-título, a que apresenta Billy Shears aka (?) Ringo Starr, na interpretação de "With a Little Help From My Friends". O conceito de concerto perde-se e o registo mesmo tendo sido importante para a afirmação do álbum, acaba por funcionar como um álbum normal. Face to Face, dos Kinks, e Velvet Underground & Nico, dos Velvet Underground, serão obras mais válidas na exploração de um conceito. 

E será Sgt Peppers o melhor disco de todos os tempos? Existe algum consenso à volta desta ideia: o primeiro álbum rock a ganhar o Grammy para "Melhor Álbum", o conceito, a capa (porque não?), as inovadoras técnicas de produção e até uma ou outra opinião contrária que só o legitima. Mas Sgt Peppers terá canções a mais. Algumas não estão ao nível do rótulo de melhor de sempre, principalmente ali entre "When I'm Sixty Four" e a “Reprise”. Lennon chegou a referir-se a "Good Morning, Good Morning" como "lixo". Mas teremos sempre “Lucy in the Sky with Diamonds”, “She’s Leaving Home” e “A Day in the Life”


domingo, 29 de janeiro de 2017

[Fundo de Catálogo] Jimi Hendrix - Are You Experienced (1967)


Enquanto os clássicos psicadélicos pululavam quase a ritmo mensal (The Doors, Jefferson Airplane, Velvet Underground & Nico e Country Joe & The Fish só para mencionar os de 1967), era editado um dos discos mais influentes da história do rock and roll. E quando referimos rock and roll, estamos mesmo a referir-nos àquele directo, bruto, lascivo, suado, cru, incendiário (no caso de Hendrix, a coisa haveria de se tornar literal). Hendrix terá inventado este rock and roll. 

E o que de novo? Misturou basicamente todos os géneros até aí inventados até então: jazz, blues, r&b, soul e psicadelismo e, para além disso, deu uso a uma data de pedais e criou condições para que a criação discos carregados de distorção e feedback passasse a ser natural. Mas se é verdade que o disco se distingue essencialmente pela forma como Hendrix toca guitarra (eventualmente, a par de Eric Clapton (Cream) e Frank Zappa), o primeiro guitar hero da história), Are You Experienced acaba por funcionar como um todo, em que as canções são mais importantes que os solos de guitarra. Algures nos anos 70, a ideia inverteu-se e os Pistols resgataram o rock mais primário. A história é mais ou menos esta. 

Mas a verdade é que Hendrix nem merecerá estar no mesmo texto que os Pistols. Ou, como haveria de dizer: I don’t want to be a clown anymore. I don’t want to be a ‘rock and roll star. É verdade que não haveria de por lá ficar muito mais tempo.

sexta-feira, 27 de janeiro de 2017

[Fundo de Catálogo] Country Joe & The Fish - Electric Music for the Mind and Body (1967)


Voltamos a repetir: o momento definidor do psicadelismo variará quase de pessoa para pessoa e é por isso que por aqui consideramos não apenas que são vários os pontapés de saída do movimento psicadélico, mas também são vários os seus momentos definidores, seja "Tomorrow Never Knows" dos Beatles, "White Rabit" dos Jefferson Airplane, "Venus in Furs" dos Velvet Underground ou "Section 43" do disco de estreia dos Country Joe & The Fish. Há até uma canção, a primeira pelas nossas contas, a  mencionar LSD, com direito a palavra soletrada: "éle", ésse", "di"! Claro que é mais uma peça central no psicadelismo, com uma base blues muito mais vincada que os pares e uma preponderância dos teclados que apenas encontrar paralelo nos Doors

É curioso perceber que os Country Joe... gozaram de alguma atenção nos anos 60, mas foram perdendo relevância histórica, o caminho inverso a muitas bandas como os Velvet Underground, citando apenas o caso mais gritante. Distinguiram-se ainda pela veia política: o próprio nome diz-se que era uma combinação de uma alcunha de Joseph Stalin (Country Joe) com uma frase de Mao Zedong (moves through the peasantry as the fish does through water), esse mesmo, o da Revolução Cultural Chinesa, do massacre que suprimiu milhões e milhões de seres humanos. Foram claros na crítica a outras guerras, principalmente à do Vietname aqui e aqui, por exemplo. 

A história ainda terá certamente algo para lhes dar.